Homenagem ao teólogo Heinz Dressel com a Ordem do Ipiranga

Evento aconteceu nesta segunda-feira, 3, no Palácio dos Bandeirantes

seg, 03/09/2007 - 11h47 | Do Portal do Governo

O governador José Serra condecorou com a medalha da Ordem do Ipiranga, na tarde de segunda-feira, 3, no Palácio dos Bandeirantes, o teólogo Heinz Friedrich Dreessel, líder do movimento contra regimes totalitários no Cone Sul nas décadas de 70 e 80. Na ocasião, o governador fez o seguinte pronunciamento.

Boa tarde a todos e a todas. Queria dizer hoje aqui da minha alegria de receber o Pastor Dressel. Outro dia, nós soubemos que ele ia ser homenageado na Argentina. Eu quase fui à Argentina, mas, quando ocorreu a idéia, me convidaram então para vir aqui.

Até esse momento, durante décadas não havia mais sabido do pastor. E fiz questão absoluta de participar dessa homenagem que foi feita na Argentina, que foi feita também pelo Chile.

Em 1973, depois do golpe do Chile, eu fui preso e depois solto com a condição de voltar no dia seguinte. Aliás, fui o único preso que saiu do Estádio naquela época. Fui o recordista nesse aspecto, mas com a condição de voltar no dia seguinte, coisa que eu não fiz. Fui para a embaixada da Itália, a embaixada foi cercada e acabei ficando lá com a minha família. Eu fiquei de outubro até maio.

E quando estava lá, em um momento muito difícil, recebi uma carta do pastor Bresser oferecendo uma ajuda. Ajuda esta financeira, uma bolsa que foi essencial para a sobrevivência naqueles meses.

E sempre guardei, trouxe comigo esse reconhecimento e daí a razão pela qual, como governador, decidi fazer esta homenagem. Não por ter eu recebido apenas esse apoio, mas por saber de tantos que também receberam suporte no momento mais difícil de perseguição.

O critério que eles usaram nunca foi um critério ideológico, era um critério de ajudar os perseguidos. Essa é a verdadeira generosidade. E era um momento em que muita gente permanecia invisível ao sofrimento daqueles que eram perseguidos.

E o Pastor Dressel – eu diria – era impulsionado ou sempre foi impulsionado por um profundo sentimento de solidariedade. Movido pelo zelo cristão para com a dignidade do ser humano. A voz dele se ergueu contra o arbítrio, suas ações foram a favor dos perseguidos e a generosidade das suas atitudes atingiu todos aqueles aos quais ele tinha alcance e que necessitavam de um abrigo, de um suporte.

No caso dos brasileiros, ele teve uma motivação paralela, que é o sentimento de brasilidade, porquanto exerceu o ministério quinze anos – não é, Pastor? – no Rio Grande do Sul.

Eu citaria aqui uma frase que ele disse a respeito desse trabalho. “O que fizemos, fizemos não foi porque queríamos, nem porque buscássemos. Apenas atuamos de maneira a responder aos desafios da história mundial”. Pois é, em determinado momento, não é porque estivesse procurando, apenas aceitou o desafio que havia naquele instante.

São palavras modestas que, na verdade, representam uma tentativa de diminuir a importância daquilo que foi feito. Mas essa importância, mas esse trabalho, essa tentativa não é bem sucedida, como mostrou o reconhecimento do governo do Chile, do governo da Argentina e agora do Governo de São Paulo.

O organismo que deu aquela ajuda, que deu aquela bolsa que o Pastor Dressel representava era a Obra Ecumênica de Estudos, um organismo da Igreja Evangélica da Alemanha, do qual pastor Dressel era o diretor e que foi criado para apoiar estudantes de diversas regiões do mundo em situação crítica.

Eu, na época, tinha uma condição anfíbia, porque era tanto estudante quanto professor. Inclusive, a bolsa, a ajuda também veio acompanhada de um convite para dar aulas na Universidade Livre de Berlim. Eu até ia, mas depois decidi ir para os Estados Unidas, para completar o meu doutorado.

Mas a Obra Ecumênica recebia os estudantes para cursos de pós-graduação, qualificando assim muitos quadros, que passaram a ocupar, inclusive depois do exílio, posições de destaque em seus países.

E Pastor Dressel se empenhou, além da ajuda e do acolhimento, também em uma terceira frente, que foi a da Campanha da Anistia.

Em 78, acompanhando Dom Paulo Evaristo Arns, que afirmara que a maior injustiça que se poderia fazer a uma pessoa era privá-la da pátria, o Pastor Dressel publicou um veemente artigo na Tribuna da Imprensa – como ele brinca na “Tribuna da Encrenca” – do Rio de Janeiro, em defesa da anistia, iniciando com as palavras “Chega de exílio”. Ali, ele preconizava que era a hora de o País abrir as portas para aqueles brasileiros que se encontravam na diáspora.

Dizia ele: “Creio que o Brasil precisa dessa gente, dessa gente amadurecida pelas amarguras do exílio, a fim de alcançar seus objetivos nos planos social, econômico e político”.

Por fim, como sabemos todos, veio a anistia, e esses quadros se incorporaram à vida do País.

Quando nós somos crianças ou mesmo quando somos jovens, às vezes uma sala, uma casa, ou um quintal são coisas que nos parecem enormes na idade que a gente tem.

Outro dia mesmo, eu fui à Igreja Dom Bosco, na Mooca, que ficou fechada muitos anos – onde eu tinha feito a minha primeira comunhão. Eu achava que era uma igreja imensa quando eu era criança. A imagem que eu tinha era de uma igreja imensa. De repente, era uma coisa bem pequenininha a igreja real.

Mas eu estou lembrando essa idéia porque de fato, com o Pastor Dressel, era o inverso dessa situação, pois já o considerávamos grande em nossa juventude. E hoje, passados tantos anos, o vemos ainda muito maior.

É, portanto, com muita satisfação que eu entrego a ele, no grau de Grã-Cruz, a maior honraria dos paulistas: a Ordem do Ipiranga que, como o nome indica, se  reporta ao momento inaugural da constituição do Brasil como uma nação livre e independente.

Pensando no passado, mas pensando principalmente no futuro, eu peço ao senhor, que além de pastor é teólogo – e portanto tem intimidade com Deus – que peça a Ele pela gente de São Paulo e do Brasil.

Muito obrigado.