Discurso de José Serra na posse da nova diretoria da Febraban

Discurso do governador José Serra, no Hotel Hyatt, em São Paulo, durante posse da nova diretoria da Febraban, em 9 de abril de 2007

ter, 10/04/2007 - 11h39 | Do Portal do Governo

Discurso do governador José Serra, no Hotel Hyatt, em São Paulo, durante posse da nova diretoria da Febraban, em 9 de abril de 2007. 

Vim aqui hoje com muita satisfação a essa solenidade. Confesso que, por problemas de agenda, tinha planejado não permanecer durante todo o ato, mas estava do lado do Fábio Barbosa ( novo presidente da Febraban) , tinha de ouvir o discurso do Fabio Barbosa, que assume hoje a federação, e vi que o orador seguinte era o (Henrique) Meirelles. Se eu saísse, já tinha dado o lead   para a imprensa: “governador de São Paulo saiu antes do presidente do Banco Central falar”. Por esse motivo preferi mudar, cancelar a reunião, e aqui permanecer. Até porque tinha também grande interesse em ouvir o presidente Meirelles. Fiquei muito satisfeito quando ele disse que agora é momento de andar mais rápido. 

Quero dizer que, para nós, é uma honra receber aqui novamente empresários financeiros de todo o Brasil. São Paulo é o lugar geométrico do setor financeiro em nosso país. Aqui estão 200 mil dos 400 mil funcionários das instituições financeiras. O setor financeiro não paga impostos para o Estado e muito pouco para a prefeitura, os impostos são mais federais. Mas gera emprego e gera renda. Mas, da ótica do governador do estado, é um setor extraordinariamente importante para a economia de São Paulo. Fico portanto muito satisfeito de acolher aqui mais uma vez. Na vez passada acolhi, participei do acolhimento, então como prefeito, quando foi eleito o Márcio Cypriano. 

O Fábio Barbosa fez, a meu ver, um excelente discurso. E ele disse uma coisa que me parece muito relevante no Brasil de hoje. Literalmente: se cada um cuidar do seu ao redor, o todo será muito melhor. Isso é um chamado para que nós assumamos sempre nossas responsabilidades na nossa esfera de atuação. A preocupação com o todo é uma preocupação fundamental. E eu tenho, como governador de São Paulo, a preocupação com o todo e com o Brasil. Mas, em certos momentos, se sobrepõe a responsabilidade com o seu setor. Eu fico muito feliz que o presidente da Febraban assuma com essa perspectiva. 

No que se refere ao nosso setor aqui em São Paulo, no governo do estado, quero sublinhar algumas linhas de ação fundamentais para o conhecimento de todos e de todas. Primeiro, estamos empenhados na reforma previdenciária do estado. A mesma que foi sugerida, indicada, tornada obrigatória pelo Congresso Nacional e por iniciativa do Executivo. Estamos com dificuldade de aprovação na Assembléia, porque o partido da oposição, cujo governo é o principal responsável pela lei, no estado tem se oposto a esta aprovação. Nós estamos bem na batalha e vejo aqui o presidente da Assembléia bastante empenhado, até pelos gestos, no encaminhamento desta questão. 

Em segundo lugar, estamos caminhando para a implantação da nota fiscal eletrônica, que teve um sucesso estrondoso na prefeitura da capital com relação ao ISS e vamos fazer no estado. Esse instrumento vai facilitar a adesão das pequenas e médias empresas ao Super Simples. Devo dizer, cujo projeto de lei original, foi de autoria do então líder do PSDB na Câmara Federal, deputado ( federal) Jutahy Jr. Dando uma demonstração de como a oposição de hoje é diferente da de ontem porque ela não aposta no quanto pior melhor, pelo contrário, aposta nas soluções para nosso país. E um exemplo é o caso do Super Simples. Vamos dar conseqüência a esta lei atual aqui no estado mediante a nota fiscal eletrônica. Inclusive com prêmios aos consumidores: descontos no IPVA, descontos em tributos estaduais outros a partir da adesão ao figurino da nota. 

Em terceiro lugar, estamos promovendo o recadastramento dos servidores, todos do Estado, diminuindo em 15% as despesas dos cargos em comissão, que são significativas em São Paulo, e revendo todos os contratos, todos sem exceção, com vistas a obter redução nos seus preços. Apenas para lembrar, estava dizendo ao dr. Lazaro ( de Mello Brandão, presidente do Bradesco) antes de a solenidade começar, a folha de salário de São Paulo, direta e indireta, quer dizer, que inclui fundações e etc., é da ordem de 35 bilhões de reais. Quando se fala em 1% da folha se fala em 350 milhões de reais. Portanto, a responsabilidade do governador, do poder executivo, da Assembléia Legislativa, do poder judiciário de São Paulo é imensa com relação ao andamento do estado. 

Uma medida importante que estamos desenvolvendo é a da desburocratização, comandada até pelo secretário (Guilherme) Afif (Domingos) aqui presente. O Banco Mundial fez uma análise do tempo de criação de empresas no mundo. O Brasil “só” ficou em penúltimo lugar ou, dependendo do enfoque, em segundo lugar no maior tempo necessário, mais de 150 dias. Eu tive curiosidade na época. Fui averiguar onde essa pesquisa foi feita. Pois ela foi feita aqui na capital de São Paulo. E por isso nós começamos na prefeitura, o Gilberto Kassab deu continuidade, e agora nós vamos promover no estado um movimento determinado de desburocratização com vistas a reduzir este prazo para duas ou três semanas no máximo. Se não for cumprido, já disse, o Afif e os outros responsáveis serão obrigados a abrir uma empresa por mês enquanto o processo se esticar. 

Ao mesmo tempo, estamos fazendo aquilo que é fundamental para São Paulo, que é a retomada dos investimentos. Há investimentos que são impostergáveis. Por exemplo, no sistema de transportes da região metropolitana, que todos nós aqui, e a nossa população muito mais, sofre no dia-a-dia, com efeitos sobre a saúde, sobre a psicologia e sobre a economia de São Paulo. Portanto, isso para nós é vital. Seja a ampliação do metrô, seja a transformação dos trens urbanos da CPTM em metrô de superfície. São investimentos pesadíssimos. Agora mesmo acabamos de autorizar o prolongamento do metrô do Ipiranga, que já vai ficar pronto, até a Vila Prudente. Isso é coisa para 1 bilhão e 400 milhões de reais, apenas alguns poucos quilômetros. E não tem outra solução. Junto com o Rodoanel, é a única medida capaz de transformar a cidade de São Paulo numa cidade possível do ponto de vista social e econômico. Estamos também procurando financiamento para o Rodoanel. Para isso não apenas teremos a possibilidade de algum financiamento de aproximadamente um terço do trecho sul, mas através de concessão. Vamos fazer concessão do trecho pronto do Rodoanel, com vistas também a obter financiamento para o trecho seguinte e assim por diante. 

Aliás, as concessões para nós são um critério de ação governamental bastante decidido. Eu tive oportunidade quando ministro do planejamento de pilotar, no governo Fernando Henrique, a elaboração de lei de concessões feita à época. E ela tem dado muito certo. Das 20 melhores estradas do Brasil, 19 são de São Paulo. Isso é uma contrapartida, sem dúvida, do processo de concessões que, do ponto de vista político, foi muito difícil de ser conduzido. Mas que nós vamos dar prosseguimento a ele, inclusive com a construção do corredor de exportação, pelo porto de São Sebastião, que vai supor a duplicação, entre outras obras, da rodovia dos Tamoios. E isso vai ser feito sem despesa por parte do governo, do tesouro do estado, mas mediante a concessão das rodovias Carvalho Pinto, Dom Pedro e Ayrton Senna, num processo que é bastante complexo, mas que em São Paulo foi bastante desenvolvido e viabilizado. E vamos estar abertos para muitas outras concessões. A queda dos juros ajuda. Porque juros elevados são umas das barreiras fundamentais ao investimento privado, uma vez que eles fixam o piso de referência para o retorno desses investimentos. Portanto, juro muito alto prejudica o próprio investimento privado na infra-estrutura. 

Meio ambiente. Outra grande prioridade. Meio ambiente. Por exemplo, apenas para ilustrar, no caso da cana de açúcar, aqui em São Paulo, hoje já cobre quatro milhões de hectares. São Paulo é responsável por 75% das exportações de etanol, praticamente há uma hiper concentração em nosso estado da cana de açúcar. Para que se tenha uma idéia, desses quatro milhões de hectares, aproximadamente dois e meio são colhidos mediante queimadas. Esses dois e meio cobrem 10% do território do Estado. Essa é uma questão que não vai ser fácil de enfrentar. Para não falar do problema da água. Recentemente publiquei um artigo mostrando inclusive quão escassa é a disponibilidade de água no estado de São Paulo. Em média, é inferior, em certas regiões, à disponibilidade existente em Pernambuco e na Paraíba, contrariamente ao folclore estabelecido. Portanto, problemas de mananciais são problemas sociais e problemas de natureza econômica. Enfim, nós vamos enfrentar a questão ambiental com outra medida, que é a da simplificação do processo. Hoje qualquer projeto, o Paulo Skaf ( presidente da Fiesp) sabe disso, qualquer projeto tem que percorrer quatro instâncias ambientais em São Paulo. Nós vamos reduzir para uma. E vamos criar uma via rápida, capaz de compatibilizar defesa do meio ambiente com a razoabilidade de previsão que os investimentos necessitam. Mas até para ganhar legitimidade para fazer isso precisamos enfrentar de maneira decidida as principais questões ambientais do estado. E isso já começamos a fazer. 

A educação é outro capítulo fundamental. Nós temos quase 6 milhões de alunos, entre as escolas fundamentais e de ensino médio, em São Paulo, com rendimentos insatisfatórios. Foi feita a inclusão, que veio do governo Fernando Henrique, que vai entrar para a história como o governo que inclui na área educacional, mas falta a qualidade, que é a questão fundamental. Eu mesmo tenho dado aula todas as semanas, coisa que eu já fazia na prefeitura, estou fazendo agora. Dou aula para terceira ou quarta série do ensino fundamental. Dou uma aula por semana. Cada semana em uma escola diferente. Ensino a construir gráficos, abscissa, ordenada, tabelas, porcentagens, apenas noções, até para motivar as escolas a fazerem isso. Verifico se os alunos sabem ler, se sabem tabuada, a maioria não sabe, porque saiu de moda memorizar a tabuada. A pessoa sabe como constrói o resultado, mas não sabe de memória quanto é, por exemplo, nove vezes sete. Eu já defendo uma tese bastante reacionária nessa matéria, que tenho levado para as escolas, de que tem que memorizar a tabuada, tem que ter torneio de tabuada, decorar a tabuada e coisas do tipo. Em algum momento, em nome do construtivismo, se fez um processo semelhante ao jogar a criança junto com a água do banho pela janela. É um trabalho bastante árduo de recuperação da qualidade do nível de ensino para a época, por exemplo, quando estudei. Sempre fui aluno de escola pública e era bastante satisfatório o aprendizado até então vigente. Estamos impulsionando muitas mudanças na área da educação. Entre elas, a gratificação financeira, monetária, das escolas segundo a evolução, o rendimento, de cada uma, coisa para beneficiar o conjunto dos professores e funcionários de cada escola. E, na área da inovação, estamos criando uma agência estadual de competitividade e mobilizando instituições estaduais, como o caso da Fapesp, para pesquisa é fundamental. Se a cana em São Paulo tem o papel que tem, isso se deveu em grande medida ao setor de pesquisas do estado, que deve ser muito fortalecido, expandido, aliás, é uma das tarefas nacionais que o estado de São Paulo cumpre sempre. 

Com relação as grandes questões nacionais, eu apenas mencionaria uma que, como governador, tenho procurado impulsionar, que é a reforma tributária. Já manifestei o acordo com a idéia de que se conduzisse o ICMS para o destino, que seria um passo importante dentro de uma reforma tributária nacional. Temos duas condições. Primeiro que isso tenha como contrapartida o fim da guerra fiscal. Porque o que não podemos ter é a co-existência dos dois sistemas, como muitos setores acreditam. Isso é inviável. Não dá para ter ICMS no destino e paralelamente a guerra fiscal garantida pela constituição na sua ilegalidade durante quinze anos. Portanto, essa é uma condição para que ela possa prosperar. Os senhores e as senhoras não calculam a irracionalidade da guerra fiscal que leva a situações em que os estados pagam, despendem recursos do tesouro líquido, para manter uma atividade econômica no seu território. Ou seja, não só não arrecadam como pagam dinheiro dos contribuintes apenas para forçar uma alocação eficiente de recursos. Portanto, essa questão, que eu sei que mobiliza bastante, da ótica de São Paulo, é encarada dessa maneira. Nós estamos aqui bastante ajustados à lei de responsabilidade fiscal, graças à herança que recebemos dos meus dois antecessores, e defendemos uma tese que hoje no Brasil pode até soar como heterodoxa, que é a de que a lei de responsabilidade fiscal seja também aplicada ao governo federal. Hoje não é. Há dispositivos que prevêem isso mas isso vem sendo progressivamente postergado, o que faz com que a responsabilidade maior do ajuste fiscal recaia sobre estados e municípios. O governo federal, de alguma maneira, fica mais solto, do ponto de vista legal, nesta matéria, coisa que não me parece correta dentro do equilíbrio federativo. Portanto a nossa tese é que a lei de responsabilidade fiscal deve ser regulamentada naquilo que impõe a sua aplicação ao governo federal. É uma tese ortodoxa que eu tenho certeza soa até heterodoxa neste momento. Mas eu me considero um bom ortodoxo em matérias de natureza fiscal. Portanto fico muito à vontade para defendê-la como medida ortodoxa. 

Com relação ao sistema financeiro, o Fabio Barbosa expôs aqui no seu excelente discurso, três finalidades do sistema financeiro, olhando bem empiricamente: viabilizar a poupança, que precisa ser remunerada para existir, viabilizar pagamentos e recebimentos, cumpre uma função de integração dentro da economia e financiar o consumo e o investimento. E tudo que eu quero como governador e também como pessoa física é que realmente o sistema financeiro possa cumprir esse papel a longo prazo e financiar cada vez mais o nosso investimento, porque nós precisamos de crescimento. E o crescimento não existe… a curto prazo pode ser, mas a médio e longo prazo requer investimento. E investimento requer financiamento compatível com o retorno que os investimentos produtivos podem proporcionar. Portanto faço votos que na gestão do Fabio e do Gabriel ( Jorge Ferreira, reeleito para presidência da Confederação Nacional das Instituições Financeiras) o sistema financeiro caminhe nesta direção junto a gestão do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Caminhamos para realizar aquela que deveria ser a função primordial, que é financiar o investimento a taxas compatíveis com o retorno dos investimentos produtivos. 

Paralelamente, o Fabio sublinhou o papel social do sistema financeiro hoje. Eu acho que pode ser um papel potencialmente muito grande. São 6% do PIB, um setor de grande rentabilidade, há muita coisa que pode ser feita na área social, eu me ofereço aqui, como governador de São Paulo, como parceiro do setor neste papel social. 

Muito obrigado.