Urbanização do campo

População rural precisa ter acesso à infraestrutura necessária para assegurar igual conectividade oferecida a quem vive nas cidades

Gustavo Diniz Junqueira
Secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo

qua, 05/08/2020 - 14h42 | Do Portal do Governo

Em 1826, o economista alemão Von Thünen desenhou o funcionamento da economia rural em 6 anéis. Desde então, geógrafos agrários se basearam nesse ‘axioma do distanciamento’, que determina a oferta de produtos, seus preços e as condições de vida das populações no espaço. Quanto mais longe do núcleo urbano, pior!

Com a construção de ferrovias, autoestradas e a invenção do telefone, tivemos a redução da distância física e, com ela, do tempo e do custo. No entanto, o Brasil ainda tem grandes desafios pela frente para que a vida no campo possa a ser comparada com a vida urbana. Mesmo em São Paulo, estado que pode ser considerado o mais desenvolvido do país, a infraestrutura ainda deixa a desejar. Com a falta desta, há a deficiência de acesso a serviços básicos, como segurança, saúde e educação. Além disso, há ainda uma grande deficiência de conectividade. Apesar do surgimento da internet e de toda a revolução tecnológica que transformou mundialmente as relações e os negócios, para quem vive e produz no campo brasileiro, a dominância do peso físico do espaço ainda é um fator relevante.

Desde a transição do nomadismo pré-histórico para a agricultura, que fixou o homem na terra, e posteriormente com a criação das cidades, foi o locus que definiu a hierarquia de poder, riqueza, renda e acesso a serviços. Essa pirâmide permaneceu durante muito tempo. Com as novas ondas de migração em função da industrialização e, mais tarde, pela expansão do setor de serviços, começamos a ver mudanças. Nossa população rural encolheu de 70%, em 1950, para 15%, em 2020. Assistimos a alteração da densidade geográfica, do preço das coisas, das oportunidades e da imagem dos diversos segmentos da sociedade.

O campo ficou para trás até o impactante avanço da tecnologia tropical e da migração sul-norte, quando o Brasil se transformou num dos principais players na oferta mundial de alimentos e demais produtos do agronegócio. Porém, essa transformação, focada na produção, não impactou da mesma forma o dia a dia da população rural. A infraestrutura ainda é precária em muitos locais e a conectividade algo muito distante.

Com o coronavírus, a vida no campo se mostrou mais estável para os que lá estão, como um dos setores que, apesar dos impactos negativos, teve a força e a persistência necessária para manter suas operações em funcionamento. Mas isso ainda não é suficiente para que assistamos a permanência das pessoas no campo e, mais ainda, a atração de profissionais urbanos. Para tanto, precisamos de ensino online, consultas médicas por aplicativo, acesso a instrumentos derivativos de gestão de risco, segurança, dentre tantos outros benefícios daqueles que moram nas cidades. O primeiro passo chama-se conectividade, que, nos dias de hoje, é talvez um dos principais direitos fundamentais do ser humano. Senão o principal, o que possibilitou a democratização de tantos outros direitos. E para a conectividade, é necessário, ao menos, que identifiquemos a localização das propriedades e da população rural. Cabe, então, as políticas públicas priorizar esse potencial e promover um novo ordenamento econômico-social do espaço.