Artigo José Aristodemo Pinotti: Para melhorar, é preciso mudar

Folha de S.Paulo - Sexta-feira, 23 de março de 2007

sex, 23/03/2007 - 12h30 | Do Portal do Governo

JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI

UMA DISCUSSÃO informada, mesmo que seja acalorada, rende frutos.

O primeiro da interação entre a recém-criada Secretaria de Ensino Superior e as universidades públicas paulistas é a preocupação com o ensino básico em São Paulo.

A proposta, que apareceu no meio do debate sobre autonomia, surgiu das próprias universidades, expressão do seu compromisso social, e foi encampada pelo governador José Serra, com a formação imediata de um grupo de trabalho (reitores e secretários) para, conjuntamente, implementar soluções a fim de melhorar a qualidade do ensino fundamental paulista, que claudica há muitos anos, independentemente do denodo dos professores.

A concentração de inteligência e inovação contida nas universidades pode oferecer rumos a diferentes políticas públicas, da mesma forma que constitui substrato propício para o desenvolvimento tecnológico e as inovações industriais.

É o caso do projeto, do governo do Estado, de implementação de cinco parques tecnológicos em São Paulo, dois deles já funcionando em Campinas e São José dos Campos. Os outros três -São Paulo, São Carlos e Ribeirão Preto-, com vocações específicas, devem se juntar à pesquisa básica das universidades nesses locais.

O Brasil produz 2% da ciência mundial, mas apenas 0,2% das patentes.

Não aprendemos ainda a transformar ciência em riqueza e distribuí-la. A interação das universidades com as áreas de desenvolvimento tecnológico e produção pode ajudar a fazê-lo.

Os núcleos interdisciplinares da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), implantados a partir da década de 80, e a maior quantidade de patentes aí produzidas constituem uma demonstração da capacidade da universidade para realizar essa interface acadêmica com a sociedade.

Mas, para estabelecer uma boa integração, é preciso compreender o complexo significado da instituição universitária de pesquisa.

As três universidades públicas estaduais de São Paulo gozam de reconhecimento internacional. São três espaços dedicados ao conhecimento, que trabalham de modo específico com a função de desenvolvê-lo permanentemente para toda a sociedade.

Sua peculiaridade e sua força repousam na aliança entre educação e geração de conhecimento e, especialmente, na vocação de formar pessoas para multiplicar ambas as tarefas.

Por isso, é essencial que a instituição universitária tenha liberdade, para não se render a utilitarismos -sejam do fordismo, sejam das políticas sociais-, e autonomia, para manter essa liberdade.

A universidade pode e deve propor idéias para esses dois lados. Porém, não é a responsável direta pela solução desses problemas, pois seu papel fundamental é preparar cidadãos capacitados para exercer essas funções e, nesse sentido, elas precisam modernizar-se continuamente.

Nada disso significa que as universidades devam ficar fora do controle do poder público e, tampouco, divorciadas da sociedade que as mantém e necessita de seu apoio.

O desafio é compatibilizar o respeito às peculiaridades da universidade -liberdade e autonomia- ajudando-as no que for necessário. O caminho é o diálogo informado, contínuo e respeitoso, que não ofereça um modelo acabado, mas que o formule conjuntamente no trajeto dessa interação.

Em síntese, esta secretaria -além de se preocupar com o aprimoramento da qualidade das nossas universidades, com o aumento de vagas sem perda de qualidade- objetiva formar um sistema de ensino superior do Estado que olhe com uma visão crítica e colaborativa para fora dele, pelo menos, em três direções: ensino básico e seu aprimoramento, desenvolvimento científico e tecnológico e empregabilidade dos profissionais formados.

Já começamos a caminhar com vários projetos inovadores nessas direções. Tudo sem perder de vista que sua principal função é a formação de recursos humanos.

O que alguns poucos parecem desejar com afirmações fantasiosas, raciocínios preconceituosos e discussões raivosas é a imobilidade, a manutenção das iniqüidades, muitas vezes porque sua correção ameaça interesses e, outras, porque as mudanças trazem o incômodo da adaptação.

Mas este governo veio mudar para melhor e, ao fazê-lo, deve contar com o apoio das forças vivas do Estado, cuja “intelligentsia” se encontra também e, em boa parcela, nas universidades. O povo elegeu Serra para ele melhorar suas vidas e, para isso, são necessárias mudanças.

JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI, 72, professor emérito da USP e da Unicamp, deputado federal licenciado (PFL-SP), é secretário de Ensino Superior do Estado de São Paulo e presidente do Instituto Metropolitano de Altos Estudos. Foi secretário da Educação do município de São Paulo (2005-2006), secretário da Educação (1986-87) e da Saúde (1987-91) do Estado de São Paulo e reitor da Unicamp.