Pesquisa com apoio da Fapesp analisa linhagens do vírus da dengue

Parceria com diversas instituições brasileiras e uma estrangeira estudou as respostas do sistema imunológico humano

qua, 18/07/2018 - 20h03 | Do Portal do Governo

Com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e desenvolvida por várias instituições nacionais e uma universidade dos Estados Unidos, um estudo constatou que uma linhagem do vírus da dengue 1 encontrada no Brasil consegue prevalecer sobre outra, embora se multiplique menos nos mosquitos portadores do vírus e nas células humanas infectadas.

De acordo com o trabalho, tal linhagem ativa menos a resposta do sistema imunológico dos doentes. Assim, sendo menos combatido, o vírus consegue se multiplicar mais no organismo dos seres humanos, o que ampliar as chances de a pessoa ser picada por um mosquito e contagiar outras. Essa linhagem consegue superar outra, com capacidade muito maior de se multiplicar em mosquitos e pacientes.

Para a condução da pesquisa, vale destacar que os cientistas analisaram as linhagens 1 e 6 (L1 e L6) do vírus da dengue de tipo 1 que afetam a população de São José do Rio Preto, no interior paulista. O estudo mostrou que, apesar de a L1 ter maior capacidade de multiplicação no mosquito e nas células, a L6 consegue minimizar e até desativar as respostas imunológicas do corpo humano, fazendo com que essa linhagem ocupe o local da L1.

“Havia três práticas para investigar as situações de multiplicação do vírus da dengue e explicar por que uma linhagem superava outra. Nossa pesquisa trouxe à tona um novo fenômeno que explica como um vírus sobrevive em uma população”, explica Maurício Lacerda Nogueira, professor-adjunto do Laboratório de Pesquisas em Virologia do Departamento de Doenças Dermatológicas, Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina de São José do Preto (Famerp) e um dos autores de artigo publicado recentemente na PLOS Neglected Tropical Diseases, com resultados da pesquisa.

“Mas não se trata só de observar se o vírus se multiplica mais ou menos no mosquito ou na célula humana para entender por que uma linhagem toma o lugar de outra. Precisamos saber como o vírus interage com o ser humano como um todo”, acrescenta o pesquisador, também presidente da Sociedade Brasileira de Virologia.

Combate

O estudo traz novos conhecimentos fundamentais para a produção de vacinas no combate à doença. No Brasil, houve três introduções de vírus da dengue do tipo 1: as linhagens 1, 3 e 6, todas com o mesmo genótipo. Em São José do Rio Preto, verificou-se inicialmente a circulação da L6 pelo menos desde 2008. Em 2010, a L1 foi identificada pela primeira vez na cidade. Por um período, ambas circularam conjuntamente.

A projeção era de que L1 apresentasse maior capacidade de multiplicação nas células e nos mosquitos transmissores, o Aedes aegypti, já que ela chegou depois de L6 e conseguiu se instalar. Porém, a partir de 2013, a L1 começou a diminuir até não ser mais detectada na população, contrariando a expectativa de que a nova linhagem fosse substituir a L6.

A constatação contrariava o conhecimento científico produzido a respeito da prevalência de uma linhagem sobre outra, um fenômeno chamado “substituição de clado” (grupo de organismos originados de um único ancestral comum).

Segundo especialistas, o fato pode ocorrer se a linhagem introduzida no meio se multiplica melhor nas células humanas do que a que já estava no ambiente. A outra hipótese é a de que a linhagem que chegou posteriormente se multiplica mais no mosquito. Em ambos os casos, afirma-se que o vírus que suplantou o outro tem um “fitness viral” melhor.

Parceria

É importante frisar que a análise em questão durou dois anos e meio e envolveu um grupo de 24 pesquisadores da Famerp, da Fundação Oswaldo Cruz, das universidades federais do Rio de Janeiro (UFRJ) e Minas Gerais (UFMG), da Unesp e um colaborador estrangeiro, Nikos Vasilakis, pesquisador do Centro de Doenças Tropicais da Universidade do Texas, dos Estados Unidos, e também coautor do artigo.

“Empregando análises epidemiológicas, filogenéticas, moleculares e imunológicas, os autores da pesquisa demonstraram que diferenças na resposta imune no hospedeiro determinam a dinâmica da circulação da dengue de duas linhagens circulantes na cidade, sugerindo que os fatores que influenciam a dinâmica da transmissão da dengue são muito mais complexos do que anteriormente se suspeitava”, ressalta o pesquisador Nikos Vasilakis.