Laboratório da USP faz testes para combater vírus da febre amarela

Por meio de parceria com a iniciativa privada, grupo de pesquisa da universidade usa tecnologias para triagem fenotípica

qua, 01/08/2018 - 15h44 | Do Portal do Governo

Um estudo do grupo de pesquisa Phenotypic Screening Platform, coordenado pelo professor Lucio Freitas-Junior, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP) descobriu que substâncias usadas no tratamento da hepatite C poderiam funcionar para combater o vírus causador da febre amarela.

É importante ressaltar que a possibilidade veio à tona em razão da tecnologia de triagem fenotípica, denominada High Content Screening. Por meio dela, as moléculas químicas ou fármacos já existentes são identificados como possíveis combatentes de um determinado patógeno, como vírus, parasitas ou bactérias.

Segundo o docente, um dos órgãos mais afetados pelo vírus da febre amarela é o fígado. Por isso, os pesquisadores utilizaram as células humanas derivadas dessa parte do corpo para fazer testes e descobrir quais compostos impediriam a infecção.

Método

Como metodologia, foi colocada cultura de células infectadas com o vírus em uma placa de ensaio com 384 poços. Cada uma delas ainda recebeu compostos químicos diferentes com ação desconhecida contra o causador da febre amarela. Vale destacar que, em algumas divisórias, foram inseridas substâncias com atividade antiviral conhecida.

“Esses fármacos são usados como controle. A análise automatizada, feita pelo instrumento, identifica qual dos compostos apresentou atividade semelhante ao antiviral já utilizado contra o vírus”, explica Lucio Freitas-Junior.

A diferenciação é feita pela máquina a partir de um software adaptado pelo grupo de pesquisa do ICB, que distingue as células humanas infectadas das não infectadas. “A triagem fenotípica torna possível determinar de forma automatizada quais das novas substâncias teve desempenho semelhante ou melhor que o dos fármacos conhecidos”, acrescenta o pesquisador.

Ele ressalta que, com essa tecnologia, a economia de tempo é maior para inserir uma droga no mercado. “Geralmente, são cerca de dez anos. Com a triagem, esse número se reduz para três ou quatro. O reposicionamento de fármacos é uma estratégia que pode ter muito sucesso”, avalia. “Quando pensamos em uma doença como a febre amarela, com letalidade de até 50%, a tecnologia traz uma esperança muito grande”, enfatiza o docente.

Aplicação

A triagem fenotípica pode ser aplicada para outras doenças humanas e de animais, como infecções por nematoides intestinais em bovinos. Giovana Cintra, uma das estudantes do grupo de pesquisa, empregou a técnica para descobrir quais compostos poderiam matar um verme de vida livre muito parecido com o patógeno dos animais.

“Incubamos os vermes e dois corantes diferentes indicam se ele está vivo ou morto. Após analisar qual composto é mais interessante, são feitas diversas melhorias na molécula para deixá-la mais seletiva ou mais potente”, explica a aluna.

O pesquisador Lucio Freitas-Junior teve contato com a técnica na Coreia do Sul, ao trabalhar oito anos com a indústria farmacêutica internacional. Em 2016, o professor trouxe a triagem fenotípica para o Brasil, por ver o potencial para o estudo de doenças negligenciadas, como dengue, zika, febre amarela e chikungunya.

Tais enfermidades são causadas por agentes infecciosos e consideradas endêmicas, sobretudo em populações de baixa renda. As moléstias também apresentam investimentos reduzidos, seja em pesquisas, produção de medicamentos e controle. “O Brasil é endêmico para as doenças as quais pesquiso, mas carente de pesquisa biomédica aplicada em interação com a indústria”, diz o cientista.

Parceria

Por isso, o grupo de pesquisa coordenado por Lucio Freitas-Junior ganhou um espaço para continuar os estudos sobre tecnologia. O ICB inaugurou, em junho deste ano, o laboratório Phenotypic Screening Platform, em parceria com a empresa Eurofarma.

A atuação em conjunto com a iniciativa privada ocorreu por meio do programa denominado “Parceiros do ICB”. Além da reforma do laboratório, o grupo também desenvolve um projeto de pesquisa de descoberta de fármacos em parceria com a mesma empresa. “Esperamos que este seja o primeiro de muitos projetos em conjunto com a indústria”, comemora o coordenador da equipe.