Estudo da USP investiga benefícios da prática de exercícios físicos

Trabalho foi publicado em revista cientifica, por meio de parceria com cientistas dos Estados Unidos e da Noruega

qua, 12/09/2018 - 16h34 | Do Portal do Governo

Uma análise publicada na revista Scientific Reports por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com colegas dos Estados Unidos e da Noruega, indica que a falta de estímulo ao músculo pode resultar no acúmulo de proteínas mal processadas dentro das células musculares e, consequentemente, em prejuízo na função do órgão. No estudo em questão, a ausência de estímulo ocorreu por uma lesão no nervo isquiático em ratos.

Vale destacar que os benefícios que a atividade física traz para a saúde são bem conhecidos, mas os processos celulares responsáveis por esses ganhos só começaram a ficar mais claros há pouco tempo.

Um caso, por exemplo, é o de lesão no nervo isquiático, geralmente observada em pessoas que ficam muito tempo sentadas, quando se está acamado por longos períodos. Com isso, intervenções capazes de minimizar ou mesmo reverter a disfunção muscular ocasionada falta de estímulo são necessárias para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.

Alerta

Os pesquisadores observaram que o acúmulo decorre do prejuízo na maquinaria celular responsável por identificar e remover tais “lixos” celulares, conhecido como sistema autofágico. Eles demonstraram que o exercício físico é capaz de manter o sistema autofágico em alerta, facilitando sua ação quando necessária, como na disfunção muscular induzida por falta de estímulo.

“A atividade física diária sensibiliza o sistema autofágico, facilitando a eliminação de proteínas e organelas pouco funcionais no músculo. A remoção desses componentes mal funcionais é muito importante. Quando acumulados, eles se tornam tóxicos e contribuem para a disfunção ou morte da célula muscular”, salienta Julio Cesar Batista Ferreira, professor do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP e coordenador do estudo.

Para explicar a autofagia no músculo, o docente faz uma analogia. “Imagine o músculo trabalhando de modo semelhante a uma geladeira, que precisa receber eletricidade para funcionar. Quando esse sinal é cessado, ao retirar a geladeira da tomada ou bloquear o neurônio que inerva o músculo, rapidamente observamos que a comida (na geladeira) e a proteína (no músculo) começam a estragar em diferentes tempos, de acordo com sua composição”, ressalta.

“Nesse momento, um mecanismo de alerta presente na célula, mas ainda inexistente na geladeira, aciona o sistema autofágico. O sistema identificará, isolará e incinerará o material estragado, evitando a propagação do dano. Todavia, se o músculo deixa de receber o sinal elétrico adequado por períodos prolongados, o sistema de alerta para de funcionar corretamente, contribuindo para o colapso celular”, completa.

“Sem a autofagia, há um efeito cascata que resulta na morte celular”, explica Juliane Cruz Campos, primeira autora do artigo e pós-doutoranda sob a supervisão de Julio Cesar Batista Ferreira, com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Metodologia

Para atingir os resultados atuais, foi feita uma cirurgia em um grupo de ratos de modo a induzir uma lesão no nervo isquiático de uma das pernas, em efeito equivalente em humanos do chamado de “pinçamento”. Isso causa bastante dor, o que faz o indivíduo poupar a perna prejudicada e, consequentemente, perder tamanho e função do músculo.

Dias antes da cirurgia, os ratos foram divididos em dois grupos. Enquanto um se manteve sedentário, o outro fez um treinamento em que corria em 60% de sua capacidade aeróbica uma hora por dia em uma esteira, cinco vezes por semana.

Após quatro semanas dessa rotina, foi feita a cirurgia. O resultado foi que a disfunção muscular induzida pela lesão no nervo isquiático se mostrou menos agressiva nos animais previamente exercitados quando comparados aos não exercitados. Nesse tempo também foram avaliados parâmetros funcionais e bioquímicos dos músculos afetados.

Os autores do estudo ressaltam que a pesquisa não busca encontrar apenas um tratamento para o “pinçamento” do nervo isquiático, que ocorre em uma parcela da população. A ideia é utilizá-lo como um modelo experimental de disfunção muscular induzida pelo desuso, a fim de entender os processos celulares envolvidos na degeneração muscular.

Isso facilitará o desenvolvimento de novas intervenções farmacológicas e não farmacológicas capazes de minimizar ou reverter esse grande problema da nossa sociedade: a disfunção muscular decorrente da falta de movimento, principalmente na população idosa.

“Se identificarmos uma molécula capaz de manter seletivamente o sistema autofágico em alerta, poderemos eventualmente desenvolver algum medicamento que possa ser administrado em pessoas com disfunção muscular decorrente da falta de estímulo”, analisa Julio Cesar Batista Ferreira.