Uma agência reguladora paulista

Folha de S.Paulo - Quarta-feira, 22 de agosto de 2007

qua, 22/08/2007 - 11h21 | Do Portal do Governo

Uma agência reguladora paulista

DILMA SELI PENA*

Folha de S.Paulo

Está na moda falar mal das agências. É preciso evitar, porém, que a compreensão de seu papel se contamine pela crítica à Anac

FALAR MAL das agências reguladoras está na moda. É preciso evitar, contudo, que a crítica à atuação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) na crise do setor aéreo contamine a compreensão sobre o papel das agências.

Ainda mais neste momento. O Congresso Nacional começa a debater a proposta de emenda constitucional 81, que institui as agências de regulação na Constituição, e o projeto de lei geral das agências. Ao mesmo tempo, o governador José Serra encaminha à Assembléia Legislativa a proposta de criação da Arsesp (Agência Reguladora de Serviços de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo).

Por que é necessário criar uma agência para regular tais serviços?

No campo do saneamento, o novo marco regulatório separa a prestação de serviços das atividades de planejamento, regulação e fiscalização. O governo planeja e define a política pública. As empresas prestam o serviço.

As demais atribuições, como definição de padrões de serviço, fiscalização da execução dos contratos e atendimento a reclamações e consultas dos usuários, podem ficar a cargo de um órgão regulador -uma agência.

Por falta de marco legal, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) acumulou alguns desses papéis ao longo do tempo. Agora, a legislação prevê uma entidade independente do governo para fiscalizar todos os serviços de saneamento ambiental: abastecimento de água, drenagem, coleta e tratamento de esgotos e de resíduos sólidos.

Quanto à energia, deve-se lembrar que São Paulo tem experiência em regulação desde 1998, com a CSPE (Comissão de Serviços Públicos de Energia). Em convênio com a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), fiscaliza -com sucesso- os serviços de 14 concessionárias do setor elétrico e também as concessionárias de distribuição de gás canalizado.

A Arsesp será um órgão de Estado, e não de governo. A condição de autarquia de regime especial confere maior estabilidade nas normas e segurança jurídica aos prestadores de serviços.

Sua atuação estará balizada pela busca de qualidade e continuidade da prestação dos serviços de saneamento e energia, tarifas justas, estrutura enxuta e quadros capacitados, com ingresso por concurso público, e forte interação com os usuários dos serviços. Terá autonomia financeira, com receitas da taxa de regulação, controle e fiscalização, não onerando, assim, o Tesouro estadual.

Para garantir uma gestão democrática, consultas e audiências públicas farão parte da rotina da agência e serão condição prévia para a maioria das decisões, incluindo a avaliação dos prestadores de serviço -entre os quais está a própria Sabesp. Aliados a essa rotina estarão os conselhos de orientação de saneamento e energia.

A Arsesp atuará nas áreas em que o Estado for o poder concedente e nos municípios que, mediante convênio, delegarem as funções de regulação e fiscalização. Não parece viável criar uma agência em cada município que dependa de um prestador de serviços nesse setor.

Ao optar por uma agência estadual de saneamento e energia, São Paulo atende à legislação federal para o setor, aproveita a experiência acumulada pela CSPE e a sinergia entre os dois setores -já que ambos utilizam redes de distribuição e estão na mesma secretaria- e economiza recursos públicos, pois não duplica estruturas administrativas.

Entes reguladores, agindo em defesa do cidadão e assegurando o necessário equilíbrio nas relações entre Estado, concessionárias e usuários, as agências contribuem para fortalecer as instituições e a democracia.

É assim desde a criação da primeira agência reguladora para o transporte ferroviário, em 1887, nos Estados Unidos. Hoje, aquele país tem 60 agências federais e 20 agências autônomas. Também a França e a Alemanha criaram agências fortes.

Uma entre 11 agências brasileiras, a Anac e sua ineficácia -seja por falta de autonomia, de recursos financeiros e técnicos, seja por incompetência gerencial- não podem pôr abaixo todo o esforço feito até aqui nem interromper o caminho já percorrido, entre outras, pela ANA -a Agência Nacional de Águas, que, com muito orgulho, ajudei a constituir.

DILMA SELI PENA, mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas, é secretária de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo e presidente do Fórum Nacional dos Secretários Estaduais de Saneamento. Foi diretora da ANA (Agência Nacional de Águas).

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