Os melhores da Unicamp

Jornal da Tarde - Segunda-feira, 6 de agosto de 2007

seg, 06/08/2007 - 13h46 | Do Portal do Governo

Jornal da Tarde

Quando o segundo semestre de aulas começa para os alunos do último ano do ensino médio, a ingênua frase: ‘O que você vai ser quando crescer?’ ganha um peso diferente. Deixa de ser uma simples interrogação e passa a anunciar a contagem regressiva para o futuro. Os jovens que estudam em colégios públicos, em especial, afirmam que para eles é ainda mais complicada a decisão, já que nem sempre a ‘qualidade’ faz parte do currículo escolar. Mas são justamente eles que surpreendem quando conseguem ingressar em alguma universidade pública.

Não que seja fácil para estes estudantes encontrar seus nomes na lista de aprovados. Fábio Santana de Oliveira, hoje com 26 anos, sempre sonhou em ser médico, mas como não tinha acesso nem à laboratório de ciências na escola estadual que freqüentou em Ribeirão Preto, no interior do Estado, seus amigos eram só risada quando ele falava em ser doutor.

Flávia Rodrigues, 23 anos, não pisou em uma biblioteca em sua escola municipal, mas sempre quis seguir a carreira de historiadora. O mesmo pânico assolava a paulistana Fernanda Souza Cruz, 21 anos, que pretendia freqüentar uma faculdade de arquitetura, sem nunca ter tido aula de Educação Artística.

Os três correram atrás sozinhos e precisaram de 12 horas de estudo diário para contrariar o que pregava o universo ao seu redor. De alunos sem perspectivas passaram a calouros da turma de 2005 na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Depois de seis meses de aula, já estavam entre os melhores da turma. E eles não são os únicos. Um levantamento da Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest), realizado com estudantes que ingressaram na entidade há dois anos, mostra que universitários que vieram da rede pública, no final do 1º semestre de 2006, apresentaram desempenho melhor do que aqueles que saíram da rede particular.

Avaliação

A vantagem de estudantes como Fábio, Flávia e Fernanda foi constatada em 34 dos 56 cursos avaliados. Isso indica que em 60% dos casos, depois de seis meses, as notas de quem concluiu o ensino médio em unidades públicas são maiores na faculdade do que as de quem pagou mensalidade na época da escola (veja acima). Os dados foram concluídos agora e o objetivo foi identificar se o sistema implantado há dois anos – que oferece aos alunos da rede pública 30 pontos a mais na nota final do vestibular – não prejudicava o aprendizado acadêmico.

‘Apesar de tirar notas muito menores no vestibular (os alunos da rede particular vão melhor nas provas em 51 dos 56 cursos), quando consegue ingressar na faculdade, o estudante do sistema público vai melhor ao longo da graduação’, afirmou o coordenador da Comissão, Renato Pedrosa. ‘A própria dificuldade serve como estímulo, porque eles saem de um ambiente menos favorecido socialmente e querem aproveitar tudo na universidade.’

Mas ainda não é tão comum encontrar ‘Fábios’ nas salas de aula da Unicamp.Das 2,9 mil vagas disponíveis, 70% ainda são preenchidas por quem estudou na rede privada.

Os motivos para proporções tão desiguais podem ser explicados por uma pesquisa da ONG Campanha Nacional pelo Direito à Educação de Qualidade, feita com o cruzamento dos dados do Instituto Nacional de Educação e Pesquisa (Inep), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ( IBGE) e Ministério da Educação. As informações foram colhidas durante três anos, de todas as escolas do País, e apresentadas no início de 2007.

Enquanto 53% dos estudantes das unidades públicas têm acesso às bibliotecas, nas privadas o índice salta para 88%. Sobre os laboratórios de ciências, apenas 15% dos alunos de instituições do governo têm um disponível e na rede particular o número chega a 58%.

A internet é disponibilizada para 25% dos colégios públicos, frente a 73% dos privados.’Desassociar infra-estrutura da qualidade de ensino é determinar que quem não pode pagar mensalidade não tem direito a um ambiente de eqüidade na escola’, afirmou o presidente da ONG, Daniel Cara.

Fernanda Cruz disse que foi preciso ‘mergulhar’ nos livros para trilhar seu o caminho . ‘No colégio, nem sempre nos dão a oportunidade de desenvolvimento.’

Para quem tem dúvida sobre a carreira a seguir, o futuro médico Fábio Santana dá a dica. ‘Se desistir, você vai dar a vitória para quem não investe em educação.’