Oposição é no Congresso, diz Serra

Folha de S.Paulo - Sexta-feira, 4 de maio de 2007

sex, 04/05/2007 - 11h14 | Do Portal do Governo

Oposição é no Congresso, diz Serra Governador de SP afirma que questões administrativas “têm de ter entendimento federal ou estadual”

Tucano, em viagem a Washington para negociar empréstimo com o BID, fala dos conflitos no PSDB em 1ª entrevista após eleito

SÉRGIO DÁVILA

DE WASHINGTON

“Oposição é no Congresso, não é nos Executivos estaduais ou municipais.” A opinião é do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), sobre frase em que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso critica a aproximação do PSDB e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na semana passada, FHC disse: “O povo está olhando para nós e dizendo: o que vocês são, peixe ou carne de vaca?”

Para o governador, “as preocupações do Fernando Henrique são legítimas” mas “as questões administrativas têm de ter entendimento federal, estadual ou municipal”, o que “não significa atrelamento”.

Serra falou à Folha na saída do prédio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), na tarde de anteontem, onde havia discutido empréstimos para a malha ferroviária e as estradas vicinais do Estado. Leia trechos da entrevista exclusiva, com perguntas e respostas reagrupadas por temas:

 

FOLHA – O sr. ouviu certamente a frase do ex-presidente FHC sobre “peixe e carne de vaca”.

JOSÉ SERRA –
As preocupações do Fernando Henrique são legítimas. Agora, não tenhamos dúvida, por outro lado, de que oposição é no Congresso, não é nos Executivos estaduais ou municipais, nem ele pensa isso. Oposição ou situação. O que não significa atrelamento. As questões administrativas têm de ter entendimento federal, estadual ou municipal.

FOLHA – Critica-se que o PSDB não está desempenhando esse papel no Congresso.

SERRA – Olha, é muito cedo. Mas está. Tanto que a CPI [do Apagão Aéreo] foi uma proposta do PSDB. Agora, tem uma dinâmica, a eleição acabou há pouco, não faz seis meses, o Lula foi reeleito. Há uma ansiedade que se explica, mas que não se justifica com relação a isso.

FOLHA – O sr. citou a reeleição. Há a questão da emenda para acabar com a reeleição.

SERRA – Não sou a favor de reeleição, mas já disse que não participei nem participarei de nenhuma articulação a esse respeito. Não há inclusive uma posição única no PSDB. E há também considerações a respeito da oportunidade política para isso. Eu não entro nesse detalhe. Apenas não vou articular, isso é uma questão do Congresso. Tenho sim, sempre defendi – aliás, eu que dei a idéia – uma emenda criando o voto distrital nos municípios que tenham dois turnos, portanto com mais de 200 mil eleitores. Se alguém quisesse fazer uma mudança no sistema eleitoral, eu começaria por aí, porque aí não tem resistência política.

FOLHA – E a duração do mandato?

SERRA – Pode ser quatro anos, pode ser cinco, pode ser seis, aí é outra questão. Mas não sou a favor de reeleição.

FOLHA – Lula disse que apoiaria uma emenda, e o governador Aécio Neves (PSDB-MG) também. O que falta para sair do papel?

SERRA – Vontade política do Congresso e provavelmente uma conjuntura que favoreça.

FOLHA – O sr. se encontrou com o ex-governador Geraldo Alckmin?

SERRA – É possível que me encontre. É uma visita natural, estou nos EUA, posso dar um pulo lá, ele está estudando [em Harvard]. [Ontem, um dia após a entrevista, o governador esteve com Alckmin]. Mas é muito mais uma visita pessoal, não tem nada de especial. Além do que, decisão sobre candidatura à Prefeitura [de São Paulo] vai ser só no ano que vem. Eu decidi ser candidato em abril de 2004, nem passava pela minha cabeça antes disso.

FOLHA – Vamos dizer que disputem o ex-governador e o prefeito Gilberto Kassab (DEM, ex-PFL).

SERRA – Não, o PSDB vai ter aliança.

FOLHA – Vamos dizer que os dois queiram ser o candidato da aliança. Qual seria o critério de desempate?

SERRA – Será uma solução natural. Não sei, tem muito tempo pela frente.

FOLHA – Hoje [quinta-feira] o Estado divulga a mudança no cálculo do número de assaltos a bancos. É o dobro do que foi divulgado antes.

SERRA – Realmente, por estímulo da imprensa, a Secretaria da Segurança fez uma revisão dos assalto a bancos. Realmente os números não batiam e isso foi corrigido. Aí é uma questão do sistema de informações.

FOLHA – Pode-se esperar então a correção para cima de outros índices, como homicídios?

SERRA – Não, não há nenhuma indicação nesse sentido. Além do que, homicídio entra pelo IML, é outro sistema. Mas, se for constatada alguma incorreção, corrigiremos também.

FOLHA – O governo federal disse que não abrirá mão da transferência dos 205 mil servidores temporários do Estado para o regime da Previdência [o INSS].

SERRA – Acho errado. E a ironia é que o PT de São Paulo, que controla boa parte das entidades do ensino, esteja fazendo greve contra o governo estadual porque quer que os temporários fiquem na aposentadoria estadual. Só que nós não só queremos isso como fomos pedir isso para a Justiça contra o governo federal. Eles estão, portanto, com a greve errada. É incrível.

FOLHA – O governo do Estado teria o dinheiro para recolher o INSS desse pessoal?

SERRA – Não. Mas aí são duas questões. Uma é financeira, outra é conceitual. Conceitualmente nós achamos que eles são funcionários públicos, não tem cabimento serem transferidos para o INSS. Além do problema financeiro. Mas eu jamais faria isso, mesmo que a custo zero.

FOLHA – Qual foi o tema principal do encontro no BID?

SERRA – Etanol. Pesquisa. São Paulo não tem mais que expandir a cana extensivamente. Nós vamos ficar centrados na produtividade. Produtividade é pesquisa e logística. Envolve o quê? Estradas, daí o programa de vicinais que eu trouxe aqui. E também a malha ferroviária da região metropolitana. Nós temos 60 km de metrô, mas temos 250 km de trilhos na Grande São Paulo. Já tem os trilhos, já tem as estações. O que você precisa fazer é sistema de funcionamento de trem e equipamentos novos. Isso vira metrô de superfície, para poluição, para condição de vida, é uma revolução em São Paulo.

FOLHA – O ditador cubano Fidel Castro critica o uso da terra para biocombustível, alegando que roubaria área destinada a alimentos.

SERRA –
É um falso dilema. No caso brasileiro, não existe esse conflito. Excluída a Floresta Amazônica, há pelo menos 90 milhões de hectares de terra sem ocupação agrícola definida que podem ser incorporados. Desses 90 milhões, pelo menos 25 milhões servem para a cana.