O papel do BNDES

O Estado de S. Paulo - São Paulo - Terça-feira, 22 de fevereiro de 2005

ter, 22/02/2005 - 8h47 | Do Portal do Governo

EDITORIAL

É compreensível a irritação do governador Geraldo Alckmin com a diretoria do BNDES, que adia, sem ter razões consistentes para tal, a concessão de um financiamento de cerca de R$ 380 milhões ao metrô de São Paulo. Há cerca de dois anos esse empréstimo vem sendo postulado. O pedido passou pelos rigorosos crivos técnicos do BNDES e estava para ser aprovado, no ano passado, quando o então presidente do banco de fomento, Carlos Lessa, foi demitido. E, ao que tudo indica, o processo voltou à estaca zero. Na quinta-feira passada, os secretários dos Transportes Metropolitanos e do Planejamento estiveram na sede do BNDES para tratar do assunto e lá foram ‘enrolados’.

Em sua indignação, o governador de São Paulo criticou a decisão do BNDES de financiar, com US$ 107 milhões, a construção da linha 3 do metrô de Caracas. Essa é uma crítica que precisa ser ponderada. O BNDES não dispõe de recursos infinitos e, por isso, precisa escolher os projetos que financiará, sempre tendo em vista o seu papel de banco de fomento do desenvolvimento nacional.

Entre financiar a expansão do metrô de São Paulo e a do metrô de Caracas, não deveria haver dúvida alguma sobre a prioridade. A ampliação do metrô paulistano é uma necessidade premente. É raro o urbanista que não reconheça que o metrô é a melhor solução para os problemas viários e de transporte público da maior cidade do País. A extensão das linhas tem, inegavelmente, um efeito positivo para a economia nacional, uma vez que afrouxa o nó dos congestionamentos que atrasam e encarecem o transporte de mercadorias originário do maior centro industrial do Brasil ou que por aqui transita em direção a portos ou a centros de consumo.

Só essa consideração bastaria para colocar o metrô de São Paulo no topo da lista de prioridades do BNDES. E os argumentos do governador Alckmin reforçam essa posição: os repasses que o governo do Estado e os municípios paulistas fazem ao Pasep e ao FAT, a fundo perdido – recursos que acabam sendo administrados pelo BNDES -, têm valor quase igual ao do empréstimo solicitado. Nada mais justo, portanto, que o retorno desse dinheiro, num projeto de grande significado econômico e social.

A questão é, portanto, de perspectiva. Não se compreende que o BNDES possa conceder um empréstimo ao metrô de Caracas, mas não ao metrô de São Paulo, ou que o faça com mais rapidez e facilidades para a capital da Venezuela do que para a capital paulista. Uma vez atendido o pleito paulista – tecnicamente bem fundado e financeiramente viável -, não há por que o BNDES não financiar o metrô de Caracas, também.

A política externa não se faz apenas com conversas diplomáticas e assinaturas de acordos e tratados. A política externa tem uma outra dimensão, mais prática, que foi por longos anos negligenciada. O governo Fernando Henrique mudou essa tendência e o governo Lula está reforçando a mudança – um dos poucos aspectos positivos da atual política externa.

O BNDES é, hoje, um dos pilares da política externa. Sua função é financiar a venda de bens e serviços, sempre que for necessário alavancar a presença de empresas brasileiras no exterior ou viabilizar obras de interligação de infra-estrutura essenciais para a integração regional. Como o BNDES está legalmente proibido de financiar empresas estrangeiras, quando atua no exterior, deve beneficiar diretamente os produtores brasileiros. A linha 3 do metrô de Caracas, por exemplo, está sendo construída por uma empreiteira brasileira, com equipamentos brasileiros.

Nos próximos dias, o BNDES deve conceder empréstimo de US$ 220 milhões para a ampliação de um gasoduto que levará combustível da Terra do Fogo à região central de Buenos Aires. A Petrobrás é uma das controladoras da empresa proprietária do gasoduto e duas empreiteiras brasileiras farão a obra. O BNDES estuda, ainda, o financiamento de estradas na Bolívia, Equador e Peru. O projeto mais adiantado, o do Peru, deverá ligar o Brasil a portos do Pacífico.

Trata-se, assim, de uma política sensata, que consolida fisicamente o processo de integração comercial e política. Essa política, no entanto, está limitada pela capacidade do País de financiar os seus projetos de desenvolvimento.