Exercício substitui repouso em novo tratamento

O Estado de S.Paulo - Segunda-feira, 6 de agosto de 2007

seg, 06/08/2007 - 13h32 | Do Portal do Governo

O Estado de S.Paulo

Contrariando a idéia de que pessoas com doenças auto-imunes, como lúpus e esclerodermia – que afetam a pele além de órgãos como pulmão e o sistema imunológico – precisam mesmo é de repouso, o serviço de reumatologia do Hospital das Clínicas (HC), em São Paulo, decidiu testar os efeitos da prática de exercícios físicos na evolução de pacientes que apresentam também comprometimento reumatológico.

O trabalho começou há dois anos e surpreendeu as coordenadoras do estudo ao apresentar resultados positivos, como a melhora da condição clínica dos pacientes, sem qualquer tipo de efeito colateral.

Agora, o hospital se prepara para abrir ao público um centro de condicionamento físico especialmente direcionado para minimizar os efeitos dessas doenças. Batizado de Laboratório de Avaliação e Condicionamento em Reumatologia (Lacre), o espaço, dentro do Instituto Central do HC, em nada lembra o ambiente de um hospital. Sob a supervisão da reumatologista e médica do esporte Fernanda Rodrigues Lima, os pacientes farão exercícios físicos em aparelhos de musculação e esteiras ergométricas como em uma academia normal.

A diferença fica por conta do acompanhamento de especialistas e da menor intensidade do treinamento. “O mais importante, no início, era saber se os exercícios não iam piorar o quadro clínico. O próximo passo é estabelecer o grau de intensidade dessas atividades para criarmos um protocolo”, diz a médica.

Além de afetarem os sistemas renal, cardiovascular e pulmonar, freqüentemente as doenças auto-imunes provocam o comprometimento das articulações. Esse quadro pode causar a diminuição da força muscular e afetar a postura e locomoção dos pacientes. Outro problema é o efeito colateral que os medicamentos, como os corticóides, usados no controle dessas doenças podem causar. Durante o tratamento do lúpus, por exemplo, uma das conseqüências pode ser a osteoporose causada pelo uso da droga.

DOENÇAS CRÔNICAS

Alguns dos primeiros beneficiados do programa do HC serão pacientes com doenças crônicas como artrite reumatóide, lúpus e esclerodermia – que pode levar à morte pela fibrose pulmonar em menos de dez anos, caso não seja controlada. Com esse diagnóstico desde 2003, a manicure Adeli Martins Pereira, de 35 anos, fez parte da primeira fase do projeto. A doença começou com uma intensa dor nos dedos e evoluiu causando manchas pelo corpo, espessamento da pele e enrijecimento das articulações, chegando ao ponto de não conseguir se alimentar por não contar com os movimentos da boca. “Precisei parar de trabalhar, pois não conseguia mais mexer os dedos”, diz ela.

Sem parar com a medicação, durante dois meses, três vezes por semana, ela fez exercícios aeróbicos e de musculação em uma academia particular, com a avaliação de Fernanda e de uma professora de Educação Física. Os resultados foram animadores. Além da estabilização da doença, Adeli ganhou força muscular e passou a se sentir melhor.

As únicas contra-indicações são para pacientes com doenças em fase aguda. Fernanda explica que os primeiros estudos que mostraram a eficácia da prática de exercícios em pacientes como Adeli começaram a surgir há cerca de uma década. Ainda hoje, no entanto, não existem protocolos médicos específicos com o uso de atividades físicas para essas doenças. “Até o final da década de 1980, achava-se que o paciente reumatológico deveria ficar em repouso para não afetar ainda mais sua situação”, revela a médica. Hoje, alguns dos pacientes de Fernanda são atletas profissionais que convivem com doenças como lúpus e artrite reumatóide, sem qualquer tipo de comprometimento.

O laboratório prepara também a triagem de um grupo de 30 crianças com leucemia atendidas no Instituto da Criança, do HC. Para isso, fazem parte do projeto as pediatras especializadas em medicina do esporte, Beatriz Perondi e Ana Lúcia de Sá. “Esperamos que a prática ajude a superar o tratamento, aumentando a capacidade imunológica das crianças”, diz Beatriz.