A primeira safra paulista de arroz vermelho

O Estado de S. Paulo

qua, 17/02/2010 - 8h00 | Do Portal do Governo

Depois de investir no arroz preto, produtor de Pindamonhangaba aposta em novas variedades exóticas

O Vale do Paraíba, que já é o maior produtor de arroz irrigado do Estado de São Paulo, tem uma grande perspectiva de se tornar também um polo especializado no cultivo de variedades exóticas de arroz.

Depois de emplacar no mercado o arroz preto, que já é consumido no eixo Rio-São Paulo-Belo Horizonte e nas principais capitais do País, graças ao empenho de um grupo de pesquisadores e produtores, chega agora ao mercado o arroz vermelho, produzido em Pindamonhangaba, onde se concentram também as principais pesquisas sobre o assunto.

A primeira safra comercial paulista dessa variedade começou a ser colhida na semana passada, na Fazenda Mombaça, pioneira no cultivo das chamadas variedades exóticas. Além do arroz preto e do vermelho, a fazenda, com área cultivada de 200 hectares, produz arroz arbóreo – de origem italiana, especial para risotos -, o koshinikare e o moti – próprios para a culinária oriental -, além do basmati, um aromático indiano, que deve ser lançado ainda neste ano.

“Fui buscar as variedades exóticas como um diferencial”, afirma o produtor José Francisco Ruzene, da terceira geração de uma família de rizicultores, tradicional no cultivo do arroz agulhinha, nas várzeas do Rio Paraíba. Ruzene foi o primeiro a acreditar na novidade, pesquisada e desenvolvida pelo Instituto Agronômico (IAC), em Campinas, e pelo Polo Regional do Vale do Paraíba da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), da Secretaria de Agricultura do Estado, que apresentou ao mercado, em 2006, a variedade IAC 600, o primeiro arroz preto nacional.

Primeiro Ruzene plantou 1,5 hectare numa área de várzea do Rio Paraíba e depois usou a semente para ampliar a área plantada, que atingiu 30 hectares, com produção média de 3 toneladas por hectare.

“Foi difícil acertar, porque essas variedades exigem cuidados especiais”, afirma. Por ser de ciclo curto – apenas 100 dias – tudo é muito rápido e o manejo exige carinho, desde o plantio até a secagem. Hoje, num total de 200 hectares e com a parceria de outros cinco pequenos produtores, o produtor já colhe mais de 400 toneladas, somadas às cinco variedades de que dispõe no seu mix de produtos. O custo por hectare chega a R$ 4 mil, cerca de 30% a mais em comparação com o custo de cultivo do arroz tipo agulhinha.

Mercado

O maior desafio de Ruzene, no entanto, foi “sair da porteira”, enfrentar o mercado e vender seu produto diretamente para supermercados, empórios e casas do ramo. Na primeira safra ele tinha um estoque de 5 toneladas e, na segunda, pulou para 30 toneladas. “Muita gente me disse não”, lembra o produtor. Hoje, porém, além da sua própria marca, ele embala o produto para outras cinco empresas, algumas delas de renome nacional. O produto também já está nos melhores e mais sofisticados lugares de São Paulo, como a Casa Santa Luzia e o empório Santa Maria, especializados em produtos diferenciados.

Para atender à necessidade constante de novidades que move o mercado e para diversificar a produção, Ruzene investiu, há cerca de quatro meses, na montagem de um centro de pesquisas dentro da própria fazenda.

Para chefiá-lo, o produtor trouxe o pesquisador Cândido Ricardo Bastos, que trabalhou na Apta Vale do Paraíba, onde coordenou os estudos sobre essas variedades. O centro de pesquisa, além de funcionar como um laboratório, também possui vários experimentos de campo, com mudas produzidas na própria fazenda. “Cada experimento leva até cinco anos para ficar pronto”, afirma.

Para lançar no mercado seu primeiro produto, o arroz preto, e montar a estrutura de beneficiamento e embalagem, o produtor calcula que tenha gasto pelo menos R$ 2 milhões, sem nenhum tipo de financiamento.

Plantio em parceria pode ajudar a expandir mercado

Por enquanto, esse tipo de arroz ainda depende da disponibilidade de sementes e de uma abertura maior do mercado. O produtor José Francisco Ruzene sabe disso, mas aposta na consolidação de um polo produtor em Pindamonhangaba, fazendo parcerias. “Não dá para ter todas as variedades numa propriedade só, por isso cada parceiro vai cuidar do cultivo de uma delas”, afirma.

Em parceria com cinco produtores, ele fornece a semente, faz a colheita, transfere tecnologias e garante a compra da produção.

O produtor Armando Sato, por exemplo, acha a parceria uma alternativa interessante. Nos próximos dias vai colher sua primeira safra de arroz preto. “Ainda é um plantio experimental, mas temos boas expectativas”, afirmou. São 20 hectares e a expectativa é colher 60 toneladas de grãos. Para o ano que vem, Sato deve manter a mesma área.

Outro parceiro, Edilberto Ruzene, cultiva arroz preto numa área de 5 hectares localizada na Colônia do Piagui, em Guaratinguetá, tradicional reduto de arroz agulhinha. “É uma cultura ideal para pequenas propriedades”, afirma. Esta será a sua quarta safra, com previsão de colheita de 15 toneladas de grãos.

A maior complicação, segundo Edilberto, é a facilidade que o arroz tem de acamar, pois tem os caules fracos. “Isso causa alguma perda”, afirma. O produtor quer expandir a lavoura para a próxima safra, mas para isso depende de arrumar terras para serem arrendadas.

Paladar

Chicão sabe que para ampliar o mercado precisa mudar hábitos alimentares e, nesse caso, a ajuda de chefs de cozinha é muito bem vinda. Na semana passada, por exemplo, o renomado chef brasileiro Alex Atala lotou o espaço reservado para um workshop sobre o arroz preto, durante a festa da 1ª Abertura Oficial da Colheita do Arroz do Vale do Paraíba, ocorrida em Guaratinguetá.

Outro chef, o catarinense Emerson Mueller, também aderiu às variedades exóticas. “Quebrou-se o mito de que esse tipo de arroz não é prático. Ele combina com vários ingredientes”, afirma o chef.

Para Mueller, o arroz preto desperta o sabor e agrega valor pelas suas qualidades nutricionais. Por isso, o arroz preto já é bem conhecido e o vermelho está no mesmo caminho. “Se o produtor não diferenciar seu produto, nós, aqui do outro lado da mesa, também ficamos sem novidades para levar ao público”, afirma o chef.

IAC testa outras variedades

O IAC não parou no arroz preto e no vermelho. Quer mais. O engenheiro agrônomo e pesquisador Omar Vieira Villela, da Apta Polo Vale do Paraíba, diz que o objetivo é definir novas cultivares do cereal, que possam ser disponibilizadas aos produtores.

Até o fim deste ano, segundo Villela, algumas novidades deverão ser lançadas, mas isso depende de resultados. “Hoje temos campos experimentais em Pindamonhangaba, Tremembé e Guaratinguetá”, diz.

Das variedades já lançadas, ele destaca o IAC 400, da culinária japonesa, que já tem mais de 100 hectares cultivados no Vale do Paraíba, por um grupo de oito produtores, e o IAC 600, que é o arroz preto. Esse último se destaca não somente pela cor, mas pelo seu sabor e aroma acastanhado, maciez e versatilidade. Além disso, o arroz preto também possui alto valor nutricional.

Outras variedades, como o arroz arbóreo (IAC 300) e o arroz para culinária tailandesa (IAC 500), dependem ainda de abertura de mercado. “Mas são produtos muito promissores”, afirma.