De segunda maior favela Paraisópolis está se transformando em bairro

Parceria entre Estado e município prevê que o local tenha água, esgoto, luz, córrego canalizado, áreas de lazer e três parques lineares

ter, 12/06/2007 - 8h56 | Do Portal do Governo

Longe de ser o paraíso em forma de cidade como supõe o nome, Paraisópolis dá sinais de que viverá dias melhores. As mãos talentosas do Gaudí brasileiro – como ficou conhecido o baiano Estevão Silva da Conceição – cuidam do calçamento da escadaria principal da segunda maior favela de São Paulo, localizada no Morumbi. Rotulado de jardineiro-artista da arquitetura espontânea, Estevão recolhe restos de azulejos e vidros em caçambas. E com muita criatividade e imaginação faz seu o trabalho voluntário nas escadas para dar beleza ao local em que vive e onde construiu sua casa que se tornou local de visitação de brasileiros e estrangeiros.

A outra escadaria (Jardim Colombo) foi grafitada pelos moradores que participaram de oficinas para aprender a arte. A revitalização de fachadas, cujas cores foram escolhidas pela população, ganhou colorido e aspecto semelhantes ao Caminito, bairro da Boca, em Buenos Aires. A construção das duas escadarias (com infra-estrutura de redes de água, esgoto, elétrica e drenagem), pavimentação de ruas, construção de calçadas, canalização de córrego, iluminação pública e retirada de barracos são algumas das ações visíveis do Programa de Urbanização do Complexo de Paraisópolis.

Unindo recursos e ações do governo paulista e da prefeitura de São Paulo e com a participação dos moradores, o programa começou em 2005. Prevê que até 2009 todos os 56 mil moradores (18 mil residências) dos três complexos (Paraisópolis, Jardim Colombo e Porto Seguro) que compõem a favela tenham acesso a infra-estrutura urbana, saneamento básico, áreas de lazer, parques lineares e melhoria nas condições de habitação, saúde e ambiental. É um projeto grandioso para uma comunidade que ocupa área de um milhão de metros quadrados (quase 100 hectares), maior que muitas cidades brasileiras. A maior favela de São Paulo é a de Heliópolis.

Investimento: R$ 137 milhões – Com orçamento de R$ 17 milhões, a primeira etapa abrangeu obras emergenciais, remoção de moradias das áreas de risco (Grotinho e Córrego do Brejo), desocupação do leito dos córregos e construção de alojamento para as famílias desalojadas. Desse total, já foram gastos R$ 9 milhões. Está em andamento a canalização do Córrego do Brejo, contenção de áreas de risco (Grotinho e Jardim Colombo), construção de residências para assentar as famílias removidas (em Jardim Colombo e em Antonico) e iniciada a construção do centro de lazer Palmeirinha (miniestádio em que fica o atual campo de futebol de terra onde ocorre a Copa Paraisópolis, que tem a participação de 24 times locais).

A segunda etapa prevê investimento de R$ 120 milhões. Serão finalizadas as obras atuais, construídos três parques lineares (nos córregos Antonico, do Colombo e do Brejo que estão sendo canalizados) e quatro áreas de lazer. Haverá a continuação da revitalização de fachadas e construção de via perimetral, que deverá ligar a Marginal Pinheiros à Praça Jules Rimet (o traçado da via está indefinido). Um trecho da perimetral está em andamento no núcleo de Paraisópolis. Esses projetos estão em fase final de licitação.

A coordenadora do projeto de Paraisópolis da prefeitura de São Paulo, Maria Tereza Diniz dos Santos, avalia que a urbanização que visa a integrar o Complexo Paraisópolis à cidade formal (com a regularização urbanística e fundiária) promoverá o acesso dos moradores locais à infra-estrutura, à inclusão social e à melhoria das condições de habitabilidade, de saúde e ambientais. Acrescenta que a favela enfrenta sérios problemas de risco geotécnico e vulnerabilidade social, difíceis de serem tratados, pois a comunidade ocupa área particular. 

Sabesp participa – Só a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) investiu R$ 4 milhões para construir redes de distribuição de água e de coleta e tratamento de esgoto. “É um projeto que leva saúde e qualidade de vida para os moradores e afasta as condições inadequadas e insalubres. Há pessoas vivendo em locais onde o esgoto corre no meio da rua e das vielas, nos pés das crianças e passam dentro das habitações. É uma situação vexatória. Mas é possível revertê-la, e estamos contribuindo para isso”, afirma o superintendente regional oeste da Sabesp, Milton de Oliveira.

Ele ressalta que as ligações irregulares feitas pelos próprios moradores trazem insegurança ao sistema de abastecimento porque “não são confiáveis e há risco de contaminação. A água da Sabesp é de excelência, uma das melhores do mundo, e há controle de sua qualidade”.

Até agora foram executados duas mil trocas de hidrômetros, duas mil novas ligações de água, 800 ligações de esgoto, seis quilômetros de rede de água e três quilômetros de redes coletoras de esgoto.

Maria Euda, moradora da comunidade de Paraisópolis, diz que era complicada a ligação anterior. “A água chegava cheia de barro, não vinha direto para casa, era difícil a situação. Quando chovia ficava com medo da enxurrada entrar em casa. Ainda bem que isso aconteceu poucas vezes e não perdi móveis.” Bernadete Maria da Silva lembra que o esgoto corria a céu aberto. “Foi péssimo criar meus filhos desse jeito. Era uma água podre misturada com fezes. Hoje tenho chuveiro, água encanada, torneira.

O córrego ainda está poluído e é perigoso pisar dentro. Mas agora está muito melhor, até o visual é outro.” Água, esgoto … – O prestador de serviço da Sabesp, Marcos de Souza, diz que seu serviço de emitir contas de água melhorou com as novas instalações da empresa. “Ficou mais fácil e rápido o meu trabalho. Antes tinha dificuldade de localizar as pessoas, encontrar o relógio, identificar o morador. Com a regularização, cada um passou a ter a sua conta”. Paulo Elizeu da Silva, dono de um bar, diz que já tinha a ligação de água e luz há quase 20 anos, desde que se instalou no local. “Trocaram o hidrômetro e colocaram um relógio de luz novo, ficou melhor. O esgoto é novidade.”    

Maria de Fátima Soares Leite reclama da “água fraca”, que “ela não sobe” e demora três horas para encher a caixa. Fica contente ao ser informada pelo encarregado do Escritório Regional do Butantã da Sabesp, Clayton Talasse, que a Sabesp já concluiu as obras subterrâneas da rede de água, e que em breve terá a água da companhia paulista chegando à sua residência. Disse que está feliz com a canalização do córrego e com a retirada dos barracos que estavam em frente da sua casa. “O cheiro não está bom, mas o esgoto não entra mais em casa.”

Talasse lembra que antes o local era um brejo coberto por barracos, com o esgoto correndo pelas ruelas e que a polícia tinha receio de entrar. “O córrego está canalizado, mas falta fazer o trabalho de drenagem e de despoluição. Já foram desapropriados 300 barracos, mas há ainda outros para serem retirados. A Avenida Perimetral, com linha de ônibus, está em construção, mas depende da desocupação de imóveis.”

Investimentos – O superintendente acrescenta que o fato de a Sabesp construir redes de água e de esgoto, e de fazer as ligações domiciliares e de a prefeitura cuidar das sarjetas, calçadas e pavimentar as ruas, permite que os moradores tenham endereço com o próprio nome já que são emitidas as contas dos serviços públicos. A meta para chegar água e esgoto em todas as residências é fazer 18 mil ligações e o investimento previsto para isso é de R$ 33 milhões. O esgoto será tratado na Estação de Barueri.

Além das obras de infra-estrutura, a Sabesp oferece atendimento à comunidade em sua Agência Móvel, localizada ao lado do Poupatempo móvel, próxima à EMEF Prof. Paulo Freire. O trailer da Sabesp dispõe de todos os serviços dos demais postos fixos e faz campanha de uso racional da água com distribuição do Almanaque da Água aos estudantes e clientes e explica o funcionamento do sistema. Tem capacidade de fazer 150 atendimentos, mas por enquanto atende de 15 a 20 pessoas por dia.

Daniela Almeida Bispo diz não ter entendido bem as explicações do funcionário, Anselmo dos Santos, chamado de “o tio da Sabesp” porque não tem “essas coisas em casa”, mas pegou o seu exemplar do almanaque. Gustavo Santos de Andrade fez questão de pegar o almanaque para presentear “os tios e tias que gastam muita água sem necessidade”. Seu colega, Denis da Silva Cardoso, reclama que seu primo fica brincando com água e desperdiça muito. “Quando escovo os dentes, primeiro coloco a pasta com a torneira desligada. Depois que termino de escovar, abro a torneira. Não desperdiço água.”

Imóveis e posse legal – A Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) viabilizou 1.018 moradias para atender às famílias que moram em área de risco (inundação e encostas). Alguns desses empreendimentos estão em construção e outros em fase de projeto. Pelos cálculos da CDHU, serão necessárias 2,5 mil unidades habitacionais para acomodar a população local. Pelo programa de urbanização, os conjuntos habitacionais podem ser erguidos em Paraisópolis ou em outras regiões próximas, como o Jardim São Luiz.

Após a finalização das obras de infra-estrutura, começa a regularização fundiária (legalização de posse das comunidades) já que boa parte dos moradores ocupa terrenos particulares que não lhe pertencem legalmente. Originalmente Paraisópolis era dividida 2,2 mil lotes de aproximadamente 500 metros quadrados cada. Os proprietários não vivem no local e a maioria tem dívidas com tributos municipais. Os lotes recebidos em doação como pagamento de dívidas e vagos serão destinados à construção de unidades habitacionais. O município já recebeu 21,7 mil metros quadrados de doação.

A prefeitura mantém convênios com a Sabesp, a CDHU e a Eletropaulo em outros projetos de urbanização de favelas. O município e a CDHU são parceiros em Jardim Olinda, Heliópolis, Monte Taó, Vila Nilo, Nova Jaguaré, São Francisco, Dois de Maio, Vila União, Santa Inês/Nossa Senhora Aparecida. Esses programas fazem parte de um convênio de R$ 400 milhões para urbanização de favelas.  Temos outro convênio com a CDHU, também de R$ 400 milhões, para a construção de unidades habitacionais. 

Gaudí brasileiro enfeita escadaria de Paraisópolis – Gaudí brasileiro trabalha nas horas vagas enfeitando a escadaria Manoel Antônio Pinto (acesso de pedestre que interliga a Rua Manoel Antônio Pinto à Rua Giovanni Gronchi) do Complexo de Paraisópolis. Será responsável também pelo calçamento do canteiro central da escadaria. Tímido, diz que começou a trabalhar com vasos e depois passou a recolher vidros e azulejos que encontrava em caçambas ou em restos de obras.

Ao ser questionado se não é o Gaudí brasileiro, dá um meio sorriso e abaixa os olhos. Só confirma quando confrontado com o resultado artístico em andamento na escadaria. Diz que nunca tinha ouvido falar do arquiteto espanhol Antônio Gaudí. Chamado de jardineiro-artista da arquitetura espontânea, lembra que construiu a sua casa com pedaços de azulejos e vidros do jeito que gostava e achava bonito. Lá vive desde 1985 com a mulher e o casal de filhos.

Seu “castelo de paraisópolis” ou “casa-escultura” lhe rendeu, além da visita de centenas de brasileiros e estrangeiros, uma viagem a Barcelona a convite de uma comissão que cuidava da comemoração de aniversário do catalão Gaudí. Estevão admite que seu trabalho é bem parecido com o de Gaudí depois que visitou as obras do arquiteto espanhol. Diz que ficou encantado pelo Parque Güel, em Barcelona.SERVIÇO

Serviço

A casa do Gaudí brasileiro fica na Rua Herbert Spence, 38, Favela de Paraisópolis.

Tel. (11) 3773 7135

Visitação: de segunda a sexta-feira, das 10 às 17 horas – falar com Edilene

É cobrada taxa de R$ 5

Claudeci Martins

Da Agência Imprensa Oficial

(J.H.)