Aparelho auditivo criado pela USP tem baixo custo

Cerca de 10 milhões de brasileiros são portadores de perda auditiva incapacitante e podem usar a nova prótese auditiva

dom, 07/03/2010 - 19h00 | Do Portal do Governo

Em breve, aparelho auditivo digital projetado e produzido no Brasil poderá ser adquirido a baixo custo. Sua manutenção também custará pouco ao bolso dos brasileiros. Essa é a expectativa dos pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), que desenvolveram o equipamento denominado Manaus.

Pacientes com deficiência auditiva binaural (nas duas orelhas) testaram a nova prótese e a avaliaram como satisfatória. Enquanto o equipamento nacional da FMUSP custa US$ 140,13 (R$ 250,00), o importado (com tecnologia similar) pode chegar a R$ 9 mil no varejo. O brasileiro oferece autonomia de 440 horas com única bateria e quatro programas de adaptação.

“Numa produção seriada, o custo desse aparelho deve chegar a US$ 100,00 (R$ 179,00), informa o engenheiro eletrônico Sílvio Penteado, do Laboratório de Investigações Acústicas (LIA) da FMUSP. A pesquisa de Penteado foi tema de sua tese de doutorado defendida em agosto de 2009 com orientação do professor Ricardo Ferreira Bento, titular do Departamento de Otorrinolaringologia da FMUSP e idealizador do projeto. Bento também é coordenador geral do projeto, que teve ainda a co-orientação do professor Nilton Nunes Toledo, da Escola Politécnica da USP.

Larga escala 

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) analisa o produto para em breve conceder a patente brasileira. É submetido às etapas de avaliação regulatória da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Assim que for aprovado pela Anvisa, Penteado acredita que o aparelho estará disponível no mercado para produção em larga escala.

O engenheiro informa que a Portaria 587, do Ministério da Saúde, classifica a prótese auditiva como tecnologia A (básica), B (intermediária) e C (avançada), de acordo com o recurso eletroacústico oferecido. Diz que os modelos disponíveis no mercado no varejo custam até R$ 12 mil (tecnologia C). Já para o Sistema Único de Saúde (SUS), os valores são de R$ 525,00 (tecnologia A), R$ 700,00 (B) e R$ 1,1 mil (C).

“O aparelho de tecnologia A é modelo analógico e representa 50% das prescrições do SUS. O tipo B é o intermédiário e tem 35% das prescrições. Já o tipo C é o de tecnologia superior e responde por 15% das prescrições”, explica o pesquisador. “O modelo que desenvolvemos atende às especificações das tecnologias A e B. Isso representa 85% da demanda de aparelhos auditivos do SUS”, completa.

Decibéis

A perda auditiva acomete 10% da população mundial. No Brasil, cuja população estimada é de 180 milhões de habitantes, a deficiência está presente na vida de cerca de 18 milhões de brasileiros. São pacientes com perda auditiva discreta, moderada, moderada/severa, severa ou profunda. Esta última é considerada surdez, não corrigida com nenhum tipo de aparelho auditivo.

O pesquisador informa que o Manaus atenderá a pacientes com perdas auditivas até moderadas/severas – 56 a 70 decibéis (dB). “O aparelho apresenta ganho auditivo estável de 62 dB”, conta. Calcula-se que cerca de 10 milhões de brasileiros são portadores de perda auditiva incapacitante (acima de 41 dB) e podem ser beneficiados com o uso de prótese auditiva.

No Brasil, de cada dez aparelhos auditivos vendidos, seis são adquiridos pelo SUS. Em 2007, o País importou 214 mil próteses auditivas, cada uma em torno de R$ 1.090,00. Em 2005, as importações atingiram 172 mil próteses, ao custo médio unitário de R$ 1.678,00. Penteado explica que o custo de manutenção das próteses auditivas importadas é muito alto para os pacientes do SUS. “Um dos objetivos do projeto é oferecer também manutenção mais barata”, destaca.

Florianópolis 

Além do Manaus, os pesquisadores desenvolveram outros aparelhos a partir de componentes padronizados: o Florianópolis (tecnologia C), o Rio de Janeiro e o Sabará (tecnologia B). Os componentes do aparelho são o microfone, o processador digital de sinais e o receptor (espécie de alto-falante), que funcionam com programa de computador (software).

O fonoaudiólogo, responsável pela adaptação do aparelho auditivo em pacientes, recebe este software simples e autoexplicativo. “Alguns softwares são tão complexos que exigem treinamento do profissional e computadores cada vez com mais recursos, ou seja, mais caros”, diz.

A pesquisadora Isabela de Souza Jardim testou o Manaus e outras próteses importadas em 60 pessoas com deficiência auditiva. O aparelho da FMUSP foi comparado a outros disponíveis no mercado, classificados nas categorias A e B. “Os resultados foram considerados satisfatórios de acordo com protocolos internacionais”, destaca Penteado. Este trabalho integra o doutorado de Isabela, defendido na FMUSP, também sob a orientação do coordenador geral do projeto, professor Ricardo Ferreira Bento.

Segundo Penteado, o conceito de equipamento genérico pode ser usado para outros produtos médicos como marca-passo, desfibrilador, bombas de infusão e equipamentos de diagnóstico. “O projeto está inserido na Agenda Nacional de Prioridades de Pesquisa em Saúde do Ministério da Saúde, que recomenda o desenvolvimento de tecnologias de reabilitação de baixo custo”, aponta.

Devido à recente divulgação do aparelho nos meios de comunicação do País, Penteado acredita que após a aprovação da Anvisa e do Inpi o Governo brasileiro poderá repensar os custos de aquisição das próteses importadas.

Da Agência Imprensa Oficial e da USP