Unicamp: Resíduo da mandioca pode ser usado no refino de petróleo em poços profundos

Pesquisadoras da Universidade descobrem que a água da prensagem de mandioca pode ser usada na produção de biossurfactantes

qua, 02/02/2005 - 16h26 | Do Portal do Governo

Pesquisadoras da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp (FEA) descobriram um processo inovador para aproveitar a água derivada da prensagem de mandioca na produção de biossurfactantes que permitem, entre diversas aplicações, o refino de petróleo. Os biossurfactantes possuem a propriedade de misturar as fases oleosas e aquosas por meio de um processo chamado emulsificação.

A técnica é simples e tira do meio ambiente um resíduo incômodo para a indústria de mandioca, que não dispõe de local apropriado para o descarte das sobras. As pesquisas demonstraram que o produto alcança níveis de 80% no refino do petróleo incorporado em areia, além de demonstrar enorme potencial para a indústria alimentícia e de fármacos. Ensaios preliminares constataram ainda ação contra o desenvolvimento de células cancerígenas. Os estudos precisam ser aprofundados, mas a atividade já desponta como esperança no tratamento de tumores.

Esperança também no tratamento de tumores

As pesquisadoras Gláucia Maria Pastore e Gisele Nobre, autoras da patente “Produção de Biossurfactantes utilizando manipueira como substrato” esclarecem que a capacidade do microorganismo Bacillus subtilis de produzir a substância denominada surfactina – um detergente degradável – já era mencionada na literatura. A novidade foi conseguir desenvolver um processo que originasse o biossurfactante, subproduto metabólico de bactérias, fungos e leveduras, através de um meio de cultura insólito, no caso a manipueira – resíduo gerado na prensagem da mandioca. O processo para que o microorganismo se reproduza com intensidade demanda, em geral, um meio de cultura singular. “Este fator encarece bastante o produto, pois as proteínas utilizadas são de alto valor, o que torna o custo das técnicas convencionais inviáveis do ponto de vista econômico”, explica Gisele.

No caso da pesquisa da Unicamp, a substância junta homogeneamente o petróleo na água e liga quimicamente com as moléculas de petróleo, realizando a sua degradação. Com isso, a indústria petroquímica ganha um importante aliado no refino do óleo em poços profundos.

Sabe-se que, tradicionalmente, as indústrias conseguem a purificação de 60% do volume de petróleo nos poços, sendo a porcentagem restante inviável de se alcançar com os produtos convencionais. A principal questão para a indústria, portanto, era encontrar um microrganismo com poder de procriação abundante e potencial produtor de biossurfactante para se atingir o rendimento adequado. Gláucia e Gisele realizaram diversos experimentos e não escondem a satisfação de exibir as amostras que comprovam a capacidade do produto. “É visível o poder de absorção do biossurfactante em relação aos produtos tradicionais. Com esse resultado será possível auxiliar em situações como um vazamento de petróleo no mar, limpando as regiões afetadas”, explica Gláucia.

As pesquisas avançam agora para o campo da engenharia genética. A idéia é isolar os genes e cultivar o Bacillus para a produção em escala industrial. Já existe uma empresa do ramo ambiental interessada na patente depositada pela Agência de Inovação da Unicamp. Mas o processo de negociação deve prosseguir até o início de 2005. “Mesmo com os resultados da pesquisa, sabemos que o microorganismo possui um potencial ainda maior. Queremos investigar outras propriedades”, destaca Gláucia. A inovação abre um leque de aplicações tanto para a indústria alimentícia, quanto para a produção de fármacos. Pode-se compor os molhos para salada, maionese e massa de pão, dando homogeneidade e diminuindo o teor de óleo. Isto garantiria qualidade maior aos produtos, uma vez que não conseguem manter por muito tempo uma consistência cremosa.

A gama de aplicações para o produto sugere ainda a ação antiviral e também bacteriostática nos alimentos e agiria em contaminantes fortes como a Salmonela e Staphiloccus. Outros ensaios atestam a utilização contra patógenos de difícil tratamento, como por exemplo, microorganismos Pseudomonas aeroginosa – presentes nos ventiladores e ar condicionado, responsável por infecções nas vias aéreas superiores.

Resíduo – A manipueira é gerada na etapa de prensagem da mandioca para se obter a farinha. A substância é riquíssima em açúcar, mas não há um destino útil e se constitui em um produto nocivo ao meio ambiente. É armazenada em taques para fermentação e na seqüência é descartada em água de rio ou solo. Por ser altamente tóxico, polui o solo e mata a vegetação. Gláucia explica que é comum o Laboratório de Bioquímica receber amostras de solo, água, plantas, frutas e vegetais de várias partes do país, para se realizar o isolamento dos microorganismos dessas amostras e fazer uma checagem do que eles produzem. A água de lavagem de frango foi um dos resíduos testados. O crescimento das bactérias, no entanto, não foi se deu com tanta eficiência como com a manipueira.

Do Jornal da Unicamp, por Raquel do Carmo Santos

(LRK)