Festa do centenário da imigração japonesa terá mais de 100 eventos em SP – parte 2

Discurso: José Serra Evento: Lançamento do calendário de eventos em comemoração ao Centenário da Imigração Japonesa Data: 13/02/08 Queria dar o meu boa tarde a todos e a todas. Cumprimentar […]

qua, 13/02/2008 - 11h06 | Do Portal do Governo

Discurso: José Serra

Evento: Lançamento do calendário de eventos em comemoração ao Centenário da Imigração Japonesa

Data: 13/02/08

Queria dar o meu boa tarde a todos e a todas.

Cumprimentar nosso vice-governador Alberto Goldman; prefeito Gilberto Kassab; o Kokei Uehara, que nos falou aqui; o deputado Samuel Moreira, que é o coordenador da Comissão Parlamentar para o acompanhamento das comemorações desse centenário; o deputado federal Walter Ihoshi; o professor Marcos Marcari, reitor na Unesp; os secretários de Estado aqui presentes: Mauro Arce; Claury Alves da Silva; o Francisco Vidal Luna e Bruno Caetano; deputado estadual Mauro Bragato; os outros deputados estaduais Paulo Barbosa; Said Mourad; Vinícius Camarinha; Reinaldo Alguz; Jonas Donizete; Gilmaci Santos; o Cônsul que nos falou, Massuo Nishibayashi.

Queria cumprimentar também o nosso cartunista, criador do mascote, Maurício de Sousa. Ele disse que era mestiço, porque era casado com japonesa e tem filhos mestiços. Mas, na verdade, eu achava que ele também. Basta olhar a cara dele para ver que, ao longo do tempo, foi assimilando os traços japoneses. Eu juro que eu achava que você era mistura até.

Queria também dar um abraço especial aqui na Tomie Ohtake, com um galanteio batido, mas sincero: está cada vez mais jovem. E a todos e a todas.

Bem, o poeta Menotti Del Picchia, modernista, escreveu que a dor, na terra da gente, dói menos. Isto talvez pensavam os pais, irmãos e filhos daqueles que partiram do Porto de Kobe, no Japão, para o Brasil. Eles viram seus familiares se afastarem no navio Kasato Maru rumo ao nosso país. Muitas daquelas pessoas nunca mais se veriam de novo. Foram 52 dias de viagem e aqui chegaram os primeiros 793 imigrantes japoneses ao Brasil, ao Porto de Santos, em julho de 1908.

Em sua bagagem, esse pessoal trazia pouca coisa. Além de uma enorme capacidade de trabalho, muita confiança no futuro: certamente, seus maiores bens.

Tudo aqui era estranho. Mas o que era comum com a gente da terra era a disposição de trabalho – que é uma marca de São Paulo. A disposição para construir um novo País, uma nova Nação. Foram inicialmente para a zona do café de São Paulo. Passaram pelo Noroeste do Estado, depois a Alta Paulista, o Norte do Paraná. Chegaram até ao Amazonas e ao Pará.

E assim, foram se embrenhando pelo continente. Desbravando até sertões, formando núcleos de colonização. Muitos dos quais, aliás, deram origem às cidades.

Hoje, os nikkeis encontram-se presentes em todo o território nacional. Mas dois terços deles estão no nosso Estado de São Paulo.

Eu sempre tive uma admiração muito grande pelos japoneses e pela sua cultura. Pela dedicação ao trabalho – fator que é crucial para nós – como contribuição que trouxeram. Aliás, é o que elevou o Japão à situação que hoje desfruta no mundo – que é a importância, o valor que dão ao conhecimento, à educação. Esta é uma característica que distingue os japoneses no mundo de hoje.

Desde cedo, eu convivi com imigrantes japoneses e com os seus descendentes. Primeiro, no Mercado Municipal, aonde eu ia para ajudar meu pai. E lá, tinha muito japoneses comerciantes de frutas e de legumes, principalmente. Eu, na época, admirava aquela capacidade de trabalho, a cortesia. Muito diferente, desde logo, da cortesia da maioria dos que trabalhavam no mercado, que eram,como eu, de origem calabresa. Nada mais diferente na cortesia do que um calabrês e um japonês. E trabalhando sempre muito corretamente, de maneira honesta, com jovialidade e alegria.

Me lembro até hoje das fisionomias. Os nomes eu não lembro mais, mas me lembro das fisionomias que conheci na época.  

Depois, na escola. Principalmente quando estudei no Roosevelt, na Liberdade, que era um bairro japonês. Hoje, já tem chinês, tem coreano. Mas na época, era puramente japonês. Lá na Rua São Joaquim, que é onde era o Roosevelt. E depois, o Anglo Latino – que era lá do lado – onde eu fiz cursinho junto com o científico.

E não só aumentava – evidentemente – o número de colegas, por causa da característica do bairro. Como a gente também podia desfrutar do ambiente oriental naquela região, que sempre me agradava bastante. A propósito, a comida que, até hoje, agrada muito. São Paulo deve ser a cidade que tem mais restaurante japonês fora do Japão, no mundo. Devo dizer que a única restrição é aqueles doces de feijão de sobremesa. Não consegui me acostumar.

Não sei nem se o Cônsul está entendendo o que eu estou dizendo, mas…

Depois, da Faculdade de Engenharia, na Politécnica – como disse o Uehara – aqui eu estudei na Poli, como o Goldman e o Kassab, aliás. O Uehara era de hidráulica, não é? E o professor, na época, catedrático, agora chama titular, era o Lucas Nogueira Garcez. O Uehara era assistente, ainda lá.

Eu lembro que como eu era presidente da UNE, no segundo semestre – não sei se foi da UEL(?) ou da UNE – em 62, creio – e me excedi no número de faltas. E em tese, ia ser reprovado.

Naquela época, excedendo no número de faltas, era reprovado. Não é que podia obter desconto, isso e aquilo.

Mas eu lembro que o Garcez tinha sido governador, me chamou e disse: “Olha aqui, como você está fazendo agitação, eu vou aqui apagar as suas faltas.” O que me permitiu passar de ano. Aliás, eu gostava muito de Hidráulica. E eu posso contar isso hoje, sem que traga nenhum problema para o Garcez, nem um escândalo na imprensa. Porque as minhas faltas eram suficientes para eu ser reprovado. Mas ele deu um jeito lá na hora, e eu pude fazer os exames.

Mas no curso de Engenharia, eu tive consciência de uma coisa. É que o número de estudantes japoneses – de descendentes, gente de primeira geração, filhos de imigrantes – era enorme, proporcionalmente ao número de alunos. Não sei se já na época do Goldman era assim. Completamente desproporcional. Chegava lá em uma turma, em uma sala de 40 – porque as turmas de subdividiam – até sete, oito, dez japoneses. Era completamente desproporcional.

Mesmo no caso do nosso Estado, a proporção da população de origem japonesa é pequena. Mas quando a gente vai olhar nas faculdades e nas faculdades de Engenharia, a proporção era altíssima.

E aí, eu tive consciência – já saindo da adolescência – da importância que o pessoal dava para estudar. Não era um problema de condição social, não.  Porque muitos viviam a vida apertada. Mas o estudo, a formação era uma coisa privilegiada. Essa eu acho que é uma contribuição que a imigração japonesa trouxe ao Brasil e que, ás vezes, é pouco enfatizada. A meu ver, é a mais importante de todas.  

Bem, hoje, em São Paulo – como eu disse – nós temos aproximadamente 2/3 da imigração dos japoneses e seus descendentes. São aproximadamente um milhão, numa população de 40 milhões. Ou seja, 2,5% da população.

É só ir olhar nessas faculdades para ver como essa proporção se eleva. O Uehara está dizendo que na USP são uns 15% e na Poli, uns 25%.

São Paulo, portanto, sente muito orgulho de ter sido a principal porta de entrada dessa imigração no Brasil, e de ser hoje o maior pólo de concentração ainda.

Quero dizer também que nós temos muitos investimentos japoneses no Brasil. Privados, mas também de financiamento público. Para citar coisas importantes,  que talvez nem todo mundo saiba: a despoluição e o aprofundamento da calha do Tietê, obra feita pelo Covas e pelo Alckmin, têm financiamento do Japan Bank for International Cooperation, o JBIC – como se diz aqui. A construção da Linha 4 do Metrô tem financiamento japonês. O programa de recuperação ambiental da região metropolitana da Baixada Santista tem financiamento japonês. É o maior programa do Brasil hoje de saneamento que nós estamos fazendo na Baixada. É o maior programa de saneamento básico, que eu tive sorte de começar na minha gestão. Vem desde a época do Covas. Como tudo demora na administração, acabou caindo para eu iniciar. Tem financiamento japonês.

Vocês se dão conta de que são todos financiamentos estratégicos para o nosso desenvolvimento. São coisas extremamente relevantes.

A assimilação nossa, dos imigrantes e seus descendentes na cultura em São Paulo, na cultura paulista, é tamanha que, às vezes, em seminários internacionais sobre metrópoles de que eu tenho participado – sobre grandes metrópoles – eu digo: Vocês querem entender São Paulo? É assim. É a única cidade do mundo onde vocês vão encontrar japonês falando português com sotaque italiano. É a única cidade do mundo, não é?

Não é o caso do Uehara, que veio do Japão. Mas os descendentes, os que já são primeira ou segunda geração, falam italianado da mesma maneira que qualquer paulistano. O Cônsul, eu tenho certeza, se passar muito tempo aqui, vai acabar falando assim.

E São Paulo – no caso, a cidade – é realmente esse centro, tem um caráter eminentemente cosmopolita. É acolhedora. São Paulo é a mais internacional das cidades brasileiras e a mais nacional das cidades brasileiras também. Aqui é gente de todo lado, sempre muito bem acolhida. É a marca da cidade e é a marca do nosso Estado.

Às vezes, eu vou para o Interior e eu vejo cidades que só têm japonês. Prefeito, gente na rua. Eu não vou nem citar, porque eu tenho medo de trocar os nomes. Mas o Ihoshi deve saber, porque os descendentes japoneses candidatos conhecem muito bem qual é a distribuição dentro de São Paulo.

Mas sabe que uma das grandes satisfações que eu tive é que, na última eleição que eu tive para deputado em 1990, pela pesquisa que eu vi do São Paulo Shimbum, ou algum outro jornal da colônia, eu fui o segundo mais votado entre os descendentes de japoneses. E apesar disso, Maurício, meu olho não foi ficando puxadinho. O primeiro era um japonês, mas mesmo assim, ter sido o segundo foi um motivo para mim de muita identificação e de aproximação.

Bem, no âmbito do Governo de São Paulo, estão previstos cem eventos. Cem eventos no âmbito do Governo. Isso não inclui coisas da Prefeitura e de outras iniciativas da sociedade civil no Estado de São Paulo, ou outras Prefeituras no Interior.

Apenas como exemplo, aqui no Palácio vai haver uma exposição de maquetes dos templos e palácios japoneses. Exposição da Figura à Abstração. A presença japonesa na arte brasileira. Lá no Horto Florestal, oficinas técnicas artísticas japonesas e a Exposição Templos e Palácios Japoneses. No Palácio Boa Vista, em Campos do Jordão, a exposição de heranças japonesas na cerâmica brasileira e oficinas das técnicas artísticas japonesas. Vai haver um seminário sobre a contribuição japonesa para o desenvolvimento sustentável em São Paulo e outro, sobre o intercâmbio Brasil – Japão em Economia, Ciência e Inovação Tecnológica. Feira Cultural do Japão. Restauração da Praça Nakatsugawa, com apoio da Prefeitura de Registro. Festival do Cinema Latino Americano. Influências e diálogos com a cultura japonesa. Além de publicações de livros, enciclopédias, concertos, espetáculos, produção de documentários e programas de TV.

Nós temos aqui cinco ou seis secretarias ou instituições do Estado envolvidas nessas festividades. Eu dei apenas aqui alguns exemplos. Tem um livrinho aí que tem a programação completa. Deve ter sido ou vai ser distribuído.

É importante ter presente que não se trata, com tudo isso, apenas de celebrar este episódio tão importante da vida brasileira. De evocar memórias, revigorar lembranças, celebrar incontáveis conquistas. Mas, também, de recuperar tradições. E, seguindo o exemplo do Japão, fazer delas uma ferramenta na construção do presente e do futuro.

Neste momento em que os nossos pensamentos se voltam àqueles que vieram da terra onde o sol se levanta para a terra onde o sol se põe, e que trabalharam incansavelmente para o desenvolvimento de São Paulo e do nosso País, nós saudamos também – eu quero dizer aqui – os nossos compatriotas que, nas últimas décadas, fizeram o caminho inverso, levando um pouco da alegria, do calor e da capacidade de trabalho do Brasil à pátria dos seus antepassados, lá no Japão. E é muita gente que foi de São Paulo para lá fazer isso.

Eu queria também aqui hoje, registrar o meu cumprimento a todos esses ausentes.

No final, quero concluir dizendo um muito, muito obrigado em japonês.

DOMO ARIGATO GOZAIMASSU

Muito obrigado.